Vietname 1 - Circuito Norte Sul
A good traveler has no fixed plans, and is not intent on arriving.
Lao Tzu
A noite já estava instalada quando aterrei no aeroporto de Hanói oriundo do Laos. Saio do terminal e ainda antes de passar na alfândega fui à procura do balcão dos vistos online que me tinha sido indicado aquando do pedido do visto feito através da internet algumas semanas antes. O pedido do visto para o Vietname é feito através de um site governamental que logo após o pagamento do mesmo nos envia um email com um documento que deve ser entregue neste respectivo balcão que ainda procuro dentro do aeroporto.
Sigo as placas que indicam o local e que acabam depois por não me levar a lugar nenhum. Pergunto e indicam-me um outro balcão para onde me dirijo de imediato.
_ Temos um problema com o seu visto! _ Dizem-me com uma cara que me deixa preocupado. _ A data de entrada especificada no documento é só daqui a dois dias e só nessa altura lhe podemos conceder o visto.
Fico em pânico e peço-lhes para dar uma olhadela no documento. Olho para o telefone para confirmar a data e é verdade. Faltavam dois dias para o início do visto. Rapidamente tomo consciência da razão desta desfazagem...
No meu plano inicial tinha planeado ficar 5 dias em Luang Prabang pelo que comprei vôo e tratei do visto com base nesse período de tempo. Mais tarde, por achar que era demasiado tempo em Luang Prabang e porque faltava tempo para o Vietname decidi antecipar o vôo em dois dias e nunca mais me lembrei de alterar o dia de entrada do visto. Conclusão, estava retido no aeroporto.
Pergunto se há alguma solução e algo que possa fazer para corrigir o problema e prontamente me dizem que ali não podem fazer nada. Que se baseiam sempre no documento que levamos das autoridades e que não o podem mudar.
Começo-me a imaginar como o Tom Hanks no filme "Terminal de Aeroporto", retido e a vaguear dentro do terminal de um lado para o outro e a dormir nos bancos das salas de embarque. Não gosto do que me varre a consciência e volto a perguntar se não há mesmo nada que se possa fazer. Depois de algumas respostas negativas, o senhor que me recebeu manda-me sentar e esperar e decide ir perguntar a um superior. Passados uns bons minutos ouço o meu nome nos altifalantes do balcão, dito numa ordem estranha e aproximo-me. Dois senhores seguram o meu documento e conversam entre si... Como em todas as situações na Ásia, parece que é sempre a primeira vez que acontece e ficam sempre todos sem saber o que fazer.
Chamam-me e dizem-me que há uma solução. Aliviado escuto com atenção e dizem-me que podem emitir um novo visto mas vou ter de pagar por isso, cerca de 45€. Quem diria... Tudo se resolve!
Com todo este tempo de espera, quando chego à zona para recolher a mala, já não está o número do meu vôo nos monitores para indicar o respectivo tapete. Vale que não existem muitos tapetes e não demorou muito até encontrar a minha mochila.
Dada a distância do aeroporto até à cidade, tinha combinado com o hotel que iria ter alguém à minha espera para me levar até lá, dado que o preço não diferia muito do táxi e teria outra segurança em relação ao trajecto que seria feito. Assim sendo, procuro ao saír alguém com uma placa com o meu nome no meio daquela multidão desordenada. Olho para a direita, olho para a esquerda, corro para a outra saída, olho em todas as direcções e nada. Decido ir comprar o cartão SIM enquanto espero, e ao voltar, mais uma vez, não encontro ninguém com o meu nome. Espero um pouco, varro de novo as duas saídas e nada. Decido então ligar para o hotel e claro, não tinham enviado ninguém. Dirijo-me aos taxis...
O primeiro dia amanhece debaixo de uma enorme tempestade. Uma chuva forte vai batendo na janela e impedindo que se consiga ver seja o que for lá fora, bem ao jeito das fortes tempestades asiáticas. Os relâmpagos acompanham e pelo atraso dos trovões vejo que não estou muito longe do centro da mesma. Desta forma é impossvel saír à rua... Decido esperar pelo fim da tempestade que não dá quaisquer sinais de querer abrandar e depois de um par de horas no quarto em que tudo continua na mesma, decido descer para a recepção. Pode ser que se sinta pressionada e me dê tréguas.
Passados uns 40 minutos no sofá da recepção e uns quantos jogos no telemóvel, a chuva abranda e permite-me finalmente saír para descobrir Hanói. O centro não é demasiado extenso e permite-me explorar a cidade da forma que gosto, a pé. Saio então com destino a Hoan Kiem.
Localizado a sul da cidade antiga fica um dos maiores lagos de Hanói, cujo nome vem de uma das mais conhecidas lendas do país, e segundo a qual, a espada do imperador Ly Thai foi recuperada aqui mesmo por uma tartaruga que nunca mais foi vista. Em homenagem à tartaruga e ao seu grande feito, foi erguida uma pequena torre numa ilha bem no centro do lago.
Um pouco mais acima e numa outra ilha que pode ser acedida através da pequena ponte Huc, fica o templo de Ngoc Son, um templo de estilo vietnamita dedicado ao General Tran Hung Dao conhecido por ter derrotado os Mongóis no séc XIII.
Um templo interessante não só pela sua arquitectura muito tradicional como pelo facto de estar rodeado de água e possuir assim mais alguma tranquilidade.
No topo norte do lago, começa a cidade antiga, a zona mais autêntica da cidade, com as suas movimentadas ruelas, mercados, oficinas de tudo e mais alguma coisa, vendedores ambulantes, e os muito conhecidos pontos de venda de comida de rua. Apesar de muito movimentada e algo caótica, é uma zona onde nos devemos perder com tempo e a pé. Cada rua, cada viela é uma surpresa e um misto muito exótico de cores, cheiros, e se nos dermos a isso, fantásticos sabores.
No Vietname é comum queimarem-se bens como televisões, computadores, carros, casas e acima de tudo dinheiro, muito dinheiro. Tudo isto se vê um pouco por todo o lado, mas claro está, não com bens verdadeiros mas sim com imitações ou falsificações. Os vietnamitas acreditam que queimando estes bens comuns do dia-a-dia os conseguem passar para os seus ancestrais e desta forma também assegurarem que nas suas próximas vidas os vão ter. Isto faz com que seja muito comum encontrarem-se estas imitações de bens para venda na rua, em especial imitações de notas que se vendem em grandes quantidades.
O passeio acaba na catedral de S. José, uma catedral de estilo neo-gótico com duas grandiosas torres sineiras e que foi inaugurada em 1886.
Ainda bem no coração da metrópole mas um pouco mais para oeste fica um dos exemplares mais bem preservados da arquitectura vietnamita, o Templo da Literatura. Fundado em 1070 pelo Imperador Ly Thanh Tong, o templo foi dedicado a Confúcio e chegou a albergar a primeira universidade do país. Hoje, além do templo e dos majestosos edifícios, possui jardins bastante interessantes e estátuas de Confúcio e dos seus discípulos.
Património da Unesco desde 2010, a Cidadela Imperial de Thanh Long foi o centro do poder militar do Vietname durante mais de 1000 anos. Um grande aglomerado de imponentes edifícios militares, muralhas defensivas e bunkers ocupam uma área significativa no distrito de Ba Dinh.
Um pouco mais a norte, o complexo do Mausuléu de Ho Chin Minh agrega dentro de harmoniosos jardins alguns edifícios de bastante importância, como o Mausuléu de Ho Chin Minh, o Palácio Presedencial, Templo da Pagode de Um Pilar e alguns museus. Isto, em frente à imponente praça de Ba Dinh.
A caminho de Ho Tay, ou Lago Oeste, páro no pequeno mas não menos interessante tempo de Quan Thanh. Ao contrário dos outros templos que visitei, este, talvez pela sua menor importância, encontra-se quase vazio e consegue finalmente transmitir aquela paz que esperamos nestes templos. Visito o templo e assisto à pequena cerimónia de uma família a queimar o seu dinheiro.
Sento-me um pouco à conversa e a absorver um pouco daquele espaço. Os templos budistas no Vietname e na China não conseguem trasmitir aquela paz e tranquilidade dos templos do Sudeste Asiático e são muitas vezes mesmo algo caóticos. Aqui em em Quan Thanh consigo encontrar alguma dessa magia e fico a aproveitar.
Uma extensa ponte liga a margem sul à margem norte do Tran Quoc, passando por uma pequena ilha onde fica o templo de Tran Quoc. Este é um dos templos mais antigos do Vietname e o que mais gostei em Hanói.
Do outro lado da ponte fica o distrito de Tay Ho, encurralado entre o lago e o rio Song Hong. Já no regresso, e por estar perto, decido visitar a ponte ferroviária de Long Bien, projectada por Eiffel e que que atravessa rio Song Hong. A ponte, bombardeada várias vezes pelos americanos e prontamente reconstruída , é hoje um dos símbolos da resiliência vietnamita.
Na entrada da ponte um sinal proíbe a passagem de peões. A travessia é dedicada aos comboios mas possui ainda assim duas vias laterias que são usadas pelas motos, uma para cada sentido, teoricamente. Não está em muito bom estado de conservação, mas ainda assim fico com vontade de a atravessar. Apesar do sinal de proibição, vejo que alguns pões o fazem e num misto de teimosia e curiosidade decido fazer o mesmo.
Um pequeno passeio ladeia a via destinada às motos. Na realidade não se trata bem de um passeio mas sim de várias placas em cimento assentes em estruturas metálicas e que em alguns casos têm uma distância algo assustadora entre elas. Por baixo não há nada e consegue-se ver o chão e o rio bem lá em baixo.
Ponho várias vezes em causa a segurança do passeio e para piorar as vertigens começam a tomar conta de mim. Ainda assim não desisto e sigo até ao final. Afinal esta é uma ponte emblemática e possui algumas vistas interessantes sobre a cidade e o rio. Há mais pessoas que o fazem...
Halong Bay
O mundo tem lugares bonitos, tem lugares muito bonitos, e depois tem lugares como Halong Bay, que nos deixam boquiabertos e nos cortam a respiração.
O dia está bonito e o sol brilha forte quando me apanham no hotel em Hanói para nos dirigirmos para Halong. Fico contente, pois um dos problemas das visitas à baía é que grande parte das vezes o tempo está escuro e nublado e a verdadeira beleza de Halong Bay não resplandece.
Demoramos um pouco mais de três horas até ao porto de Halong City, onde um pequeno barco de cruzeiro espera por nós. Aqui, a realidade é outra, com o que de pior o turismo de massas pode fazer a um local. Dezenas e dezenas de autocarros a deixarem e a recolherem centenas e centenas de pessoas. Barcos e mais barcos a lutarem para ter espaço naquele pequeno porto e a infiltrarem-se naquela azáfama da entrada e saída de turistas e de toda a logística associada.
O tempo começa a escurecer, e aquela sorte que pensei que iria ter começa a falhar, mas não desanimo. Somos encaminhados para o nosso barco e lá vamos nós.
Na realidade, Halong Bay faça chuva ou faça sol é sempre um daqueles locais fascinantes. Mal o barco se começa a embrenhar naqueles milhares de pequenas ilhas calcárias cobertas daquela luxuriante vegetação somos logo tomados por um fascínio sem igual e deixamos de conseguir pensar em qualquer outra coisa. A monotonia com que navegamos naquela imensidão, a paz e o sossego daquele mar, toda aquela envolvência deixam-nos num estado de letargia profunda sem que consigamos ter alguma reacção.
Paramos em Hang Sung para visitar a maior das grutas existentes na baía. Finda a visita, começamos um lindíssimo passeio de caiaque até Hang Luon, uma maravilhosa lagoa no meio de imponentes rochedos calcários.
O dia termina com um maravilhoso jantar no nosso cruzeiro no meio daquele paraíso e com umas boas horas de conversa com os companheiros de viagem. Várias nacionalidades ali representadas e também de várias gerações.
Abeçoado que sou, tenho um fantástico dia de sol para me fazer a despedida de Halong Bay. Começamos o dia em Titop, uma pequena ilha onde é possível aceder ao topo através dos seus mais de 340 degraus e de onde se obtém uma fabulosa vista da baía.
A ilha possui também uma pequena praia de areia onde podemos descansar e dar um mergulho após a subida ao topo. Terminada a visita, voltamos ao barco para uma última ronda antes de regressarmos.
Sapa
Acordo às 5h25 para poder apanhar o autocarro das 7h da manhã em Hanói que me vai levar a Sapa. Cerca de 5h30 de viagem até à capital do turismo do Norte do país.
Sapa é uma antiga estância de montanha criada pelos franceses em 1922. Actualmente não possui grandes vestígios desse tempo mas no fundo agora é essencialmente conhecida por ser a base para um grande número de trilhos que percorrem as montanhas do norte e atravessam muitas das aldeias com tribos locais.
Chego a Sapa a meio do dia e debaixo de um nevoeiro cerradíssimo. Não se consegue ver mais que alguns metros e torna-se difícil econtrar a direcção para a qual me devo dirigir para encontrar o meu hotel. Deixo o autocarro com a mochila às costas e lá vou eu às apalpadelas.
Tendo a tarde livre decido ir fazer uma caminhada por um dos trilhos mais curtos, até Cat Cat. Começo a descer de Sapa e à medida que vou descendo o nevoeiro começa-se a dissipar.
O caminho vai-se desenrolando pelo meio de campos de arroz, outros cultivos e pequenos aglomerados de casas até ao vale onde passa um pequeno ribeiro e onde os campos dão lugar à floresta. Preparo-me para atravessar o ribeiro por uma ponte suspensa quando começa a chover torrencialmente. Abrigo-me num telheiro de um pequeno ponto de venda onde uma senhora vende bebidas, alguns snacks e frutos secos. A chuva parece não querer parar e a senhora, sem conseguir falar muito comigo, oferece-me uma cadeira e instala-me confortavelmente sob o telheiro, oferecendo-me alguns frutos secos de seguida. Tomo então uma cerveja para acompanhar até que a chuva passe.
Passado algum tempo a chuva dá então sinais de querer abrandar e decido arriscar e partir. Despeço-me e agradeço muito à senhora e ponho-me a caminho até Cat Cat.
Cat Cat é uma pequena aldeia tribal mas já algo descaracterizada pelo turismo, a grande maioria dele nacional. Ainda assim, a aldeia é interessante e mostra muito do modo de vida destas tribos locais.
No final da visita, quando já me preparava para começar a subir para Sapa, vejo um grupo de rapazes com um ar algo suspeito e cara de comprometidos nas traseiras de uma casa com um maçarico a queimarem o pelo a um animal. Fiquei curioso e aproximei-me para tentar perceber que animal era, mas rapidamente me arrependi ao perceber do que se tratava... Um gato.
O segundo dia em Sapa acordou na mesma, com um nevoeiro cerrado que continuava a não me permitir ver fosse o que fosse da cidade. Tinha agendada uma caminhada pelo vale Muong Hoa e por algumas das aldeias tribais e estava bastante expectante, pelo que, ainda antes da hora marcada lá estava eu no local combinado.
O grupo foi-se juntando a pouco e pouco. Um casal de japoneses, um malaio, um americano, dois amigos israelitas, franceses, britânicos e mais uma ou outra nacionalidades. Um grupo de senhoras com vestes tribais começa-se também a aproximar e a rondar o grupo. Vão-se apresentando e em pouco tempo percebo que serão as nossas guias pelo vale.
Ainda o sinal de partida não tinha sido anunciado e somos brindados com uma chuvada que nos começa a deixar preocupados com a nossa caminhada. Eu estava preparado e tinha um impermeável, o qual vesti de imediato. Outros não tanto e decidem de imediato comprar protecção numa loja de desporto que estava mesmo ali ao lado...
Já passa algum tempo da hora quando somos informados da partida. Uma senhora que já se me tinha apresentado segue ao meu lado e começamos então a descer.
O início ainda pela estrada é fácil, ainda que com alguma inclinação, mas não tardou até sermos desviados para um trilho estreito e lamacento que ia dividindo alguns campos de arroz. Eu vinha preparado com calçado adequado, ao contrário de alguns membros do grupo que parecia terem vindo ao engano. O japonês vinha de chinelos de enfiar no dedo, o americano e mais algumas pessoas vinham de ténis.
A chuva vai dando tréguas de tempos a tempos, mas o trilho começa a ficar cada vez mais enlameado e escorregadio. As nossas guias, de galochas, parecia que estavam a andar num piso ompletamente normal e iam-nos olhando com algum gozo.
Até que o trilho começa a ganhar grandes declives, com alguns degraus na terra e cobertos de uma lama quase líquida. Com calma vou conseguindo descer, algumas vezes com uma mãozinha da guia que se continua a movimentar de forma bastante confiante e segura. Quem diria que as galochas funcionariam tão bem aqui.
Sou interrompido por um grito e olho para trás. Vejo o americano de costas no chão e coberto de lama dos pés à cabeça. Passados alguns minutos, um novo grito. É a vez do japonês sentado no chão.
As cenas vão-se repetindo. Ora um, ora outro, ora de costas, ora de barriga no chão. Eles chegam ao ponto de se descalçarem e arriscarem fazer a caminhada descalços. O americano já mal se reconhece no meio de tanta lama... O japonês desiste e volta para trás.
Os meus sapatos, apesar de bastante enlameados, passam neste complicado teste e lá me vou aguentando. As condições são muito difíceis mas toda aquela paisagem é uma grande recompensa para o esforço.
Socalcos de um verde muito vivo e bonito moldam as encostas das montanhas que nos rodeiam, interrompidos aqui e ali por algumas manchas de floresta e alguns campos de diferentes cultivos. De tempos a tempos alguns aldeões trabalham os campos, abrem comportas e reparam os socalcos. Atravessamos aldeias, terrenos e quintais e convivemos com as tribos e em especial com as crianças. Apreciamos os animais que vão criando, como porcos (uma raça de porco preto semelhante à nossa), galinhas e búfalos. Ali tudo é autêntico, tudo é natural...
O tempo melhora e chegamos à aldeia de Y Linh Ho, onde somos esperados para o almoço.
Deliciamo-nos com mais uma refeição típica da região, sempre com muitos vegetais frescos à mistura. A gastronomia vietnamita é de facto muito rica e bastante saudável.
Seguimos caminho pelo vale até ao ponto final da caminhada e onde umas carrinhas já nos esperam para nos levar de volta ao topo da montanha e a Sapa. Necessito mesmo de uma chuveirada e começo a imaginar o difícil que será limpar os meus sapatos...
Saio para lanchar depois da árdua tarefa de me lavar a mim e aos meus sapatos, que apesar de tudo estavam bem mais encardidos do que eu e onde a lama ficou tão entranhada que acredito que nunca mais vá saír. Quero também dedicar-me um pouco à leitura e escolho um dos muitos cafés da cidade. Instalo-me confortavelmente num alpendre bastante simpático e peço um sumo de fruta natural. Leio, planeio os próximos dias e vejo os 3 metros de cidade que me são permitidos no meio daquele nevoeiro cerrado.
É já noite quando tento saír mas uma chuva forte estraga-me os planos. Espero que passe mas não passa, até que o dono do café aparece ao pé de mim com uma capa para a chuva. Diz-me e insiste que posso ficar com ela, mas eu sinto-me um pouco constrangido com aquela situação e não quero aceitar. Tanto insiste, e dado eu estar a ver que a chuva não vai passar tão depressa, decido aceitar mas proponho pagar-lhe a capa. Diz-me prontamente que não com um sorriso e para seguir...
Chega a hora do jantar e tenho planos para ir a um dos muitos conhecidos churrascos da cidade e de provar inclusivé o tão famoso leitão da zona. Percorro algumas ruas, escolho o que me parece melhor e arrisco.
As doses davam perfeitamente para mais do que uma pessoa mas eu quero provar tudo e vejo-me de repente na frente de um majestoso banquete. O churrasco é bom e o leitão também. Crocante e um pouco como o nosso. Mas falta aquele molho...
Ao terceiro dia tudo muda, e este meu último dia em Sapa permi-te finalmente ver a cidade e todos aqueles edifícios nas encostas que me rodeiam. O tempo ainda amanhece nublado, mas o nevoeiro desapareceu por completo. É estranho ter estado ali aqueles dias sem sequer imaginar que a cidade seria assim. É estranho ver os picos e os recortes daquelas montanhas imponentes e que até então nem sequer existiam para mim.
Faltam ainda algumas horas para o autocarro que me levará de volta até Hanoi e decido ir até Tram Ton, um pequeno parque natural a cerca de 15Km da cidade e conhecido pela sua densa e impenetrável floresta e pelas suas cascatas. Tento negociar um taxi que me possa levar lá. O primeiro pede 500d e leva-me a desistir. O segundo já baixa para 400, e o terceiro fixa nos 250. Temos negócio!
No caminho para Tram Ton o taxista pára numa pequena banca de venda de fruta e ausenta-se por um pouco. Quando regressa traz um pequeno saco com algumas ameixas que me oferece e com as quais me delicio no caminho até ao nosso destino.
Sigo um trilho circular mas muito mal indicado o que me leva a perder-me algumas vezes. O estreito trilho vai rompendo pelo meio da floresta, atravessa algumas vezes os riachos e passa por algumas cascatas verdadeiramente impressionantes.
Sapa é uma cidade lamacenta e bastante esburacada e que nasceu como uma espécie de estância de montanha dos colonos franceses que aqui se refugiavam do intenso e húmido calor do verão vietnamita. Actualmente funciona como zona de lazer dos nacionais que também aqui fogem ao calor, e como centro de caminhadas para os estrangeiros que querem explorar as montanhas da região.
É uma cidade com um crescimeno impressionante e uma espécie de Algarve da montanha. Por todo os lado são visíveis guindastres e torres em construção e num curto espaço de tempo a cidade estará toda transformada.
Phong Nha
Vôo de Hanoi para Dong Hoi e de imediato apanho uma táxi até Son Trach, para uma viagem de cerca de uma hora que me custa mais que o próprio vôo, numa verdadeira low cost vietnamita. Son Trach é uma pequena vila que serve de base para quem quer explorar o impressionante parque natural de Phong Nha Ke Bang.
Pong Nha possui algumas das formações calcárias mais antigas do planeta e um gigantesco emaranhado de grutas e rios subterrâneos. É um dos paraísos da espeleologia e um dos lugares mais impressionantes em termos de paisagens naturais do país.
Instalo-me num pequeno hotel familiar bem no centro da vila e aproveito o resto do dia para um passeio de bicicleta pelas redondezas.
O acesso ao parque natural é bastante restrito e para o visitarmos temos de o fazer através de uma das muitas agências existentes em Son Trach. Marco o meu passeio através do hotel e fica combinado que me apanham na manhã seguinte na entrada do mesmo.
O dia está bonito e desço para o pequeno almoço na ampla sala que funciona como garagem, recepção, restaurante e sala de estar da família que gere o negócio. Como a minha panqueca de banana numa das mesas do canto ao mesmo tempo que o bebé da família assiste a vídeos no youtube e a mãe vai dando conta da cozinha. O filho mais velho dá conta da recepção e vai jogando alguns jogos no computador.
Não tarda até chegar um rapaz da agência que vai organizar o meu passeio. Relembra-me do que tenho que levar e lá vamos nós. 100 metros à frente pára em frente ao pequeno escritório da empresa e pede-me para esperar. Faz uma série de telefonemas e passados alguns minutos vem ter comigo e pergunta-me:
_ Importas-te que em vez de irem numa carrinha vão numa mota? É que és a única pessoa deste tour, e assim mandava-te apenas com uma nova guia nossa que anda a precisar de praticar o inglês e só sabe conduzir a mota.
_ Sem qualquer problema! _ Respondo! Temos aventura!
Passados alguns minutos chega finalmente a minha guia. Encontram um capacete que quase me serve e lá vamos nós!
Visitamos algumas partes do parque, alguns trilhos, algumas cascatas e vamos praticando o nosso inglês. A minha guia sempre muito profissional e com muita vontade de aprender.
O ponto alto é Paradise Cave, um enorme complexo de grutas com uma infinidade de formações no seu interior bastante impressionantes. Foi também possível visitar uma das grutas em que tivémos de caminhar com lama até à cintura no meio da escuridão e num ambiente algo claustrofóbico, caiaque num dos rios e um longo e vertiginoso slide onde aterrei com o rabo no chão a toda a velocidade e que me fez passar largos minutos a ver estrelas sem me conseguir mexer.
Após o regresso à vila e na entrada do hotel fui abordado pelo rapaz, filho dos donos, que gostaria de me levar a jantar num restaurante típico ali perto. Aceitei com satisfação e combinámos assim uma hora.
Há hora marcada compareço na recepção, onde estava um jovem casal que também foi convidado para o jantar. O casal, ele italiano e ela galega estavam a percorrer o sudeste asiático já desde a Australia, onde tinham vivido nos últimos anos, e pretendiam ir até o mais próximo possível da Europa onde se iriam instalar a seguir.
O pequeno restaurante não era mais que um pequeno balcão e algumas mesas espalhadas pela rua. Seguimos as sugestões do nosso anfitrião e mais uma vez nos deliciámos com a comida que nos foi sendo trazida. No final, o rapaz pede a conta e diz que o jantar é por conta dele, o que não foi aceite nem por mim nem pelo casal, que no fim de muito insistirmos lá pagámos nós o jantar ao rapaz.
Hué
A viagem entre Son Trach e Hué foi feita num dos Sleeping Bus que percorrem as grandes distâncias do país durante a noite e que estão equipados com camas em vários níveis tipo beliche. A viagem era de apenas 4 ou 5 horas e foi feita durante a manhã tendo apanhado um desses autocarros que parou na vila e mesmo em frente ao hotel onde estava hospedado.
Para minha grande sorte fui uma das primeiras pessoas a entrar e pude-me instalar de imediato. Entraram mais alguns jovens e foi quando começou a confusão. O autocarro estava com overbooking e além de não haver lugar para todos, não havia espaço para as malas. Mala para aqui, mala para ali, pessoas para aqui, pessoas para ali e lá seguimos, entalados na montanha de malas e pessoas sentadas no corredor.
Hué continua a ser um dos símbolos do imperialismo vietnamita. Apesar de já não ter a imponência de outros tempos, devido ao grande número de edifícios destruídos durante a guerra, Hué é ainda assim uma cidade grandiosa com as suas muralhas e a sua cidadela bastante sumptuosos.
O autocarro deixa-me mesmo no centro da cidade. Não estou longe do hotel e apesar do calor extremo que se faz sentir decido ir a pé até lá. A temperatura está altíssima e é até ao momento a cidade mais quente por onde passei.
Permaneço no hotel até a temperatura baixar um pouco e me ser possível visitar a cidadela sem um grande sacrifício. A cidadela foi construída entre 1804 e 1833 e está no centro de uma grande fortificação que contém 10Km de muralhas e 10 portas de acesso.
O interior está dividido em várias secções, com o centro imperial, a cidade púrpura e alguns templos. Algumas residências fazem também parte do complexo assim como alguns edifícios militares.
Não muito longe da cidadela fica o grande mercado de Dong Ba, que bem ao estilo vietnamita vende tudo o que possamos imaginar. Destaque para a zona de frescos e de produtos alimentares onde se encontra também de tudo.
Hoi An
O trajecto entre Hué e Hoi An é feito de carro com um motorista privado. O preço é bastante simpático e desta forma, além de ser bastante mais confortável, é possível fazer algumas paragens a meio para visitar alguns pontos interessantes, como a praia de Lang Co, uma das mais bonitas da região, a porta de Hai Van Quan com o seu olhar altivo sobre Da Nang e a própria cidade e estância balnear de Da Nang.
Hoi An é tudo aquilo que temos no nosso imaginário sobre o Vietname. Uma vila bastante acolhedora com uma incrivel atmosfera e um estilo arquitectónico aconchegante. Pessoas a passearem na rua com os seus chapéus típicos, vendedores ambulantes e muito comercio tradicional.
É também conhecida como a vila das lanternas e onde todas as ruas estão decoradas com lanternas das mais variadas cores. Chego a Hoi An à noite e não esquecerei nunca o impacto deste meu primeiro passeio na cidade.
Todos os espaços estão elegantemente decorados, como os restaurantes, os bares, os pequenos comércios, e todos têm um ar extremamente acolhedor e simpático. É uma cidade com um grande romantismo.
Todo o centro histórico se conhece muito facilmente a pé e deve ser conhecido a pé. Cada rua, cada canto, cada praça tem o seu encanto. Edifícios coloniais, tradicionais, Templos, a ponte Japonesa, os canais, o rio, os mercados, tudo isto nos arrasta para este mundo de magia.
Aqui é possível visitar alguns dos melhores restaurantes do Vietname e saborear o que de melhor a gastronomia vietnamita tem.
A não perder é também o mercado de Hoi An, que além de tudo o que lá se pode encontrar, tem também uma secção com pequenas bancas onde se prepara e vende comida. Aqui podemo-nos sentar ao balcão de qualquer uma destas bancas e saborear alguns dos melhores pratos da região a preços bastante convidativos.
A poucos quilómetros fica a praia de Cua Dai, uma extensa e paradisíaca praia de areia branca que ainda mantém viva muita da cultura e tradições locais e sem se ter ainda rendido à massificação do turismo.
Com saudades do mar aluguei uma bicicleta para me deslocar até lá e escolhi uma das muitas concessões existentes, um pouco mais a norte onde as praias são melhores. Hidden Beach, chamam-lhe, e diz a placa que me convence a entrar.
Oferecem-me um parque para a bicicleta, um olho na mesma e uma cadeira de praia em troca de algum consumo. Observo os pescadores e os seus botes redondos com que saem para a pesca. Observo os locais na praia e um disputado jogo de futebol. Observo o mar e um pôr-do-sol inesquecível...
Isto sim é o paraíso. Isto sim me preenche.
Gosto tanto que volto no dia a seguir para os meus últimos momentos em Hoi An. Momentos ainda mais inesquecíveis e que jamais esquecerei.
Ho Chi Minh
Chego ao aeroporto de Da Nang e recebo a notícia que o meu vôo para Ho Chi Minh está atrasado. Só sai à 1 da manhã o que me vai fazer chegar tardíssimo à grande metrópole do sul do país, a antiga Saigão.
Ho Chi Minh é a mais cosmopolita e vibrante cidade do Vietname. Uma cidade com uma grande vitalidade que me fez lembrar a Bangkok do início dos anos 2000.
Deixo-me ir nas ruas e grandes avenidas da cidade. Deixo-me levar pelos sentidos, pelas multidões e pelos instintos. Bairros tradicionais, arranha-céus, Palácios, templos e até uma Catedral de Notre Dame.
Um pouco mais a norte visito o templo de Jade, um templo algo caótico como todos os outros mas bastante interessante e acom alguns detalhes incomuns.
Ao saír, sou surpreendido por uma tempestade impressionante com chuva do mais torrencial que podemos assistir. Sou forçado a esperar mais de uma hora para que a chuva passe, e no final mais meia hora para que o nível da água desça.
Assisto ao caos de Da Kao e sigo rumo ao hotel...
Cerca de 40 Kms a norte de Ho Chi Minh fica a região de Cu Chi, conhecida pelos seus tuneis utilizados pela população local durante a guerra com os Estados Unidos. É um dos símbolos da tenacidade e da persistência do povo vietnamita e desempenharam um papel muito importante durante a guerra. Os túneis, que chegaram a medir mais de 250Km, eram um importante meio de comunicação e coordenação entre as tropas localizadas nos vários enclaves.
Durante a visita é possível entrar num dos túneis e visitar o seu interior. Existem alguns avisos em especial para cardíacos, mas nada de muito especial. Quando confrontado se também iria entrar o guia responde prontamente:
_ Não, que já experimentei e os túneis são muito apertados e sem oxigênio.
Fico a pensar que está na brincadeira, e apesar de não gostar de sitios fechados e muito apertados decido entrar. No fundo é apenas uma demosntração e o trecho deve ser pequeno.
Não podeia estar mais enganado! Além de os túneis serem extremamente baixos e ter de andar quase de gatas, este parecia não ter fim... Andei, virei à direita, à esquerda, mais direitas e mais esquerdas e aquilo parecia não acabar. Com um grande auto-controlo lá cheguei ao fim mas sempre a pensar como podem mandar as pessoas atravessar o tunel daquela forma sem que lhes seja dada mais informação?
Phu Quoc
A primeira coisa que me vem à cabeça quando penso em Phu Quoc é, lixo! A ilha, que poderia ser um paraíso está repleta de lixo. Há lixeiras a céu aberto atravessadas pelas estradas de acesso aos resorts de luxo, há lixo e mais lixo espalhado por toda a ilha, lixo e mais lixo em todas as praias.
Phu Quoc é uma espécie de Samui dos anos 90 mas que dentro de muito pouco tempo será a Samui dos anos 2010 com o factor lixo à mistura. Uma ilha onde actualmente se constrói em todo o lado e onde as infra-estruturas continuam deficitárias.
Fico num hotel na zona noroeste da ilha, felizmente a zona com menos lixo tanto em terra como nas praias.
A ideia de vir para Phu Quoc era a de poder descansar uns dias da viagem e do facto de andar sempre de um lado para outro, ainda antes de embarcar rumo à Europa. Não esperava a ilha assim tão suja, mas o objectivo principal foi cumprido.
Consigo ainda alugar uma mota para explorar a ilha e todos os seus recantos. O único problema foi ter-me esquecido de me proteger e ter apanhado um valente escaldão nas pernas e braços.
No final, tento comprar um bilhete para o ferrry que me levaria a Ha Tien e onde teria de apanhar um autocarro com destino a Phnom Penh no Camboja. O último autocarro parte por volta da hora de almoço e como tal teria de apanhar o primeiro ferry, às 8 da manhã.
Recebo a notícia de que o ferry das 8 está esgotado e que vou ter de ir no das 12h. Faço contas, consulto os horários em Ha Tien e vejo que não tenho hipótese de apanhar o autocarro. Ainda assim arrisco. Estamos na Asia e há sempre uma solução!
A entrada no ferry é caótica mas lá se vai desenrolando. Tomo o meu lugar mas mal a viagem se inicia noto que posso vir para o topo do ferry, para o convés. É o que faço para apreciar melhor a viagem que vai durar bem mais do que uma hora.
Ao chegar a Ha Tien apanho um taxi até ao posto de turismo, de modo a saber se têm alguma solução. Sou atendido por uma senhora já de alguma idade que me diz que sim, que há sempre solução e que vai estudar a melhor hipótese. Fico algum tempo à espero e no final diz-me que já sabe como vamos fazer.
Pergunta-me pelo visto para entrar no Camboja e digo-lhe que pretendo tirar na fronteira ou então ali em Ha Tien se for possível. Prontamente me responde que também pode tratar do visto ali e pede-me os meus dados, alguma documentação e vinte dolares. Como não tenho ainda dólares também se prontifica a trocar-me dinheiro.
Passado mais de 1h, e eu já sem saber bem o que iria acontecer, chega uma pessoa que lhe entrega uma carrinha de 9 lugares e ela de imediato manda-me entrar.
_ Vou aqui? _ Pergunto.
_ Sim, vamos, eu levo-te.
Bom, confio na senhora e lá vamos nós.
Paramos na primeira bomba de gasolina, onde abastece a carrinha e mete água no motor. Seguimos até à fronteira.
Já na fronteira, ainda do lado do Vietname, manda-me saír da carrinha e esperar por ela na entrada do edifício. Passados alguns minutos junta-se a mim e entramos. Pede-me o passaporte e dirige-se ao balcão. Vou atrás e ordena-me que me sente! Bom, confio...
Passados uns minutos vem ter comigo, devolve-me o passaporte e diz-me para atravessar o controlo a pé, o que faço de imediato. Chegado ao outro lado, já ela está à minha espera e dirigimo-nos para a fronteira do lado do Camboja. Pede-me de novo o passaporte, vai para o balcão e diz-me para esperar sentado. Chama-me de seguida para ir fazer o controlo de saúde e dá-me de novo o passaporte. Está tudo ok, saímos e lá vamos nós em direcção a Kampot.
Vamos algo devagar e começo-me a interrogar se vamos assim até Phnom Penh. Mas chegados a Kampot as minhas dúvidas desaparecem e sei que vou passar para uma outra carrinha de 9 lugares de uma outra empresa que me levará até ao destino final...
Laos & Vietnam 2017
Laos 1 - Luang Prabang
Thousands of candles can be lighted from a single candle,
and the life of the candle will not be shortened.
Happiness never decreases by being shared.
Buddha
Luang Prabang, a pérola do Laos, fica na margem do rio Mekong na zona norte do Laos. Esta pequena cidade, património da UNESCO, é o mais importante destino turístico do país, albergando 33 templos budistas e um grande número de edifícios coloniais franceses. Uma mistura exótica de um estilo chique europeu com um certo charme colonial e antigo, e adornada pela luxuriante e densa vegetação tropical asiática.
Não é difícil apaixonarmo-nos por Luang Prabang. Aqui respira-se tranquilidade e sente-se uma harmonia especial que paira e envolve todos os elmentos. As pessoas são de uma delicadeza e de uma simplicidade sem igual e não perdem nunca a oportunidade de nos presentear com um lindíssimo sorriso.
A cidade vive do turismo e para o turismo. No centro seguem-se os hotéis, hostéis e guesthouses, cafés, bares e inúmeros restaurantes que servem na sua maioria pratos locais. A gastronomia é bastante rica e conta ainda com muita influência francesa. É também muito presente a cultura de street-food e um pouco por todo o lado existem pequenas bancas a vender algumas das iguarias mais famosas de Luang Prabang.
É na peninsula entre os rios Mekong e Nam Khan que ficam grande parte dos templos e pontos turísticos de interesse. O maior, bem no centro e início da penísula é o complexo do Palácio Real e Wat Ho Pha Bang. Este antigo palácio, construído em 1904 chegou a ser a principal residência do rei Sisavang Vong (1905-1959) cuja estátua se encontra na sua frente. O complexo, com os seus bonitos jardins, além do palácio e do templo engloba ainda um teatro e alguns museus.
A pouco mais de 1Km, que acaba por parecer muito mais dado o calor e humidade extremos, fica o Wat Wisunarat, outro interessante complexo com um dos templos budistas mais antigo e ainda em funcionamento do país.
De modo a facilitar a mobilidade de e para a península, durante a estação seca são construídas algumas pontes em bambú sobre o rio Nam Khan. As pontes apenas permitem o atravessamento de pessoas dada a sua visível fragilidade, a quem é depois cobrado um pequeno valor monetário. Fico apenas com a dúvida se apenas se cobra aos turistas ou a todos incluíndo os locais...
O principal mosteiro de Luang Prabang é Wat Xieng Thong, composto por um templo principal e várias outros edifícios de menor dimensão, como que pequenas capelas e stupas. Trata-se de um lindíssimo edifício de telhados desnivelados e com paredes revestidas de mosaicos ricamente trabalhados e ornamentadas com as mais variadas figuras e símbolos budistas.
Na segunda metade do primeiro dia de visita decido ir visitar as famosas cascatas de Tat Kuang Si, a cerca de 32Km da cidade. Negoceio com um tuk-tuk um valor que acho razoável e metemo-nos ao caminho. Noto que o condutor não está muito convicto e passado pouco tempo de começarmos a nossa viagem começa a ligar para alguém. Cerca de 2Km mais à frente pára e diz-me que não me pode levar às cascatas mas que falou com o irmão que tem uma van e que ele me leva pelo mesmo preço. Só temos de esperar ali 2 minutos por ele... Fico um pouco decepcionado, pois nada bate a autenticidade de uma viagem de tuk-tuk naquelas bandas, mas também reconheço que a distância é algo grande para este tipo de veículos. Dentro do período de espera prometido lá aparece o irmão, que me indica para entrar para a parte de trás da van. Instalo-me e lá seguimos nós!
Tat Kuang Si é uma sucessão de cascatas desniveladas e alternadas entre si por várias piscinas lindíssimas de um azul esverdeado de fazer lembrar os jardins do paraíso. O acesso é feito através de um trilho por entre a densa floresta da zona, que acompanha as várias cascatas, contorna o maior de todas pela parte superior da montanha, mergulhando depois na imensidão da floresta.
A última das cascatas é a maior e mais bonta de todas, com as suas várias quedas de água que vão descendo e contornando vários blocos calcários, até acalmarem na azul piscina na sua base. O cenário paradisíaco perfeito com este contraste entre o azul da piscina, o branco da água que cai e o verde luxuriante da floresta em redor.
O trilho acompanha toda esta beleza até ao topo, onde se localiza um grande lago e de onde se pode obter uma excelente perspectiva da mesma. Lá do alto, também uma vista soberba de toda a zona, e da sua densa floresta tropical.
O terceiro dia em Luang Prabang começa cedo, pois sou informado que o barco para visitar as Pak Ou Caves sai às 8h da manhã de um pequeno ancoradouro no rio Mekong perto de Wat Xieng Thong. Como desconheço todo o processo para a compra de bilhetes e entrada no barco vou um pouco mais cedo para me assegurar que tudo corre bem. Chego sensivelmente 20 minutos antes e não encontro ninguém no ancoradouro com ar de quem vá fazer a visita nem com ar de quem esteja a controlar essa operação. Espero um pouco até que um rapaz que andava ali pela margem do rio vem ter comigo e me pergunta para onde quero ir. Explico-lhe que quero ir visitar Pak Ou, ao que ele prontamente me diz: _ O barco já saíu, mas se quiseres tenho um amigo que faz os tours e leva-te. _ Acho estranho e transmito-lhe essa mesma sensação. Tanto no guia como no hotel estava mencionado que o barco saía às 8h.
Discutimos um pouco sobre a questão e eu sempre com a sensação que o objectivo dele era canalizar-me para a viagem com o amigo dele. Falamos dos preços e opto por esperar pela hora normal do barco. Ele sempre por ali, à espera que eu mudasse de ideias... Que no fim acabei por mudar... Eram praticamente 8h e nem sinal do barco nem de outros visitantes. Digo-lhe então que aceito e ele imediatamente liga para o amigo que já vinha a caminho. Descemos para o ancoradouro e em poucos minutos o barco chega e estou a embarcar.
O barco sobe lentamente o rio Mekong que nesta altura do ano já se encontra barrento devido às chuvas que caem de tempos a tempos. A viagem deve durar umas 3h e apenas temos uma paragem numa pequena aldeia típica das margens do rio.
A viagem é bastante bonita, tanto pelas paisagens que vamos encontrando como pela vida e rotinas que vamos podendo apreciar. O rio é a fonte de tudo aqui. Fonte de alimento, agua e transporte, e fonte de turistas também.
Além de mim vai cerca de uma meia dúzia de turistas no barco, que lá vai subindo o rio no seu ritmo melcancólico. Algum tempo depois começamos a reduzir a velocidade e aproximamo-nos de um outro barco encostado nas margens do rio, que tinha mais alguns turistas. Dá para perceber que tinha avariado e que tinha pedido ajuda ao nosso para levar as pessoas que nele viajavam. Operação de reembarque concluída e lá seguimos nós com o barco completamente cheio. Próxima paragem, a pequena aldeia típica, conhecida pelas suas tapeçarias e pela sua aguardente de arroz que nos é dada a provar mal pomos o pé fora do barco.
Pak Ou Caves são um conjunto de grutas numa impressionante escarpa calcária na margem do rio que albergam centenas de imagens de Buda. São como que um pequeno santuário onde ao longo dos tempos se foram depositando estas imagens. A primeira das duas grutas visitáveis é a mais pequena e a que alberga o maior número de imagens. São imagens bastante distintas com vários tipos, materiais e formas.
A segunda gruta, um pouco mais acima, e de maior dimensão não possui nenhum tipo de iluminação e é bastante escura. Possui também algumas imagens e espaços de homenagem a Buda.
Finda a visita, embarcamos para o regresso a Luang Prabang e para mais uma interessante viagem na rotina do rio Mekong.
Depois de um delicioso almoço com vista para o rio, inicio a minha subida a Phu Si, uma colina de 100m de altura no coração da cidade, que além das excelentes vistas que proporciona, possui também vários templos e um mosteiro budista.
Já no cimo, faço um novo amigo, um menino com uma camisola de me encher de orgulho...
E aproxima-se o fim da minha estadia em Luang Prabang. Na última noite saio para jantar num dos restaurantes que já tinha visitado e que tinha gostado imenso na rua Sakkarin. Um espaço aberto, com saborosos pratos locais, com boa decoração e muito tranquilo, e onde um rapaz costuma tocar ao vivo algumas músicas tradicionais do Laos. Depois de jantar tenho tempo ainda para beber um copo na esplanada de um Wine Bar bastante simpático perto do hotel.
Último dia, acordo cedo para ainda aproveitar um pouco da cidade antes de apanhar o meu vôo para Hanoi ao fim da tarde. Ao preparar tudo para o checkout não encontro a minha mochila e começo a ficar bastante preocupado. É o meu último dia e tenho tudo na mochila, carteira com os cartões e dinheiro, máquina fotográfica, Go Pro, e mais importante que tudo, o passaporte. Reviro o quarto todo e não encontro a mochila. Tento reconstruír os meus passos para tentar perceber onde a poderia ter deixado e lembro-me do Wine Bar. Normalmente saía à noite sem a mochila, mas como aquela era a última, levei-a para poder tirar mais algumas fotografias e, como não estava habituado, esqueci-me dela no bar...
Saio disparado do hotel em direcção ao bar bastante preocupado. A mochila tinha ficado num dos sofás da esplanada. Ao subir a rua começo a ver que o bar estava com todas as portadas fechadas e ainda não se encontrava em funcionamento. Bom, posso esperar algumas horas para que o bar abra, pois o vôo é só ao final da tarde penso, mas a preocupação não iria parar... Ao chegar mais perto vejo um papel colado numa das portadas e aproximo-me para ler, pois penso que poderá conter o horário de abertura. Num misto de espanto e de alívio vejo que era direccionado a mim e que dizia que a mochila que tinha sido esquecida lá se encontrava num hotel na esquina a seguir. Vôo para o hotel, onde o simpático recepcionista me devolve a mochila. Agradeço imenso e saio ao mesmo tempo que confirmo que está tudo lá e que não tocaram em nada. Respiro fundo de alívio...
Pequeno almoço tomado, faço e checkout e pergunto se têm algum local onde possa tomar um banho antes de ir para o aeroporto. Ainda queria dar um passeio e visitar um templo e com aquele calor extremo e húmido iria passar o dia a transpirar. Dizem-me que sim, que têm uma pequena casa de banho com chuveiro na entrada e que a posso utilizar...
O discreto Wat Sensoukaran, apensar de não ser dos mais importantes de Luang Prabang é, ao meu ver, um dos mais bonitos e como tal decido dedicar-lhe algum do tempo deste meu último dia. Possui vários edifícios em muito bom estado de conservação e todos eles muito bem trabalhados e decorados.
Tenho ainda algum tempo para sentir a cidade de uma forma mais descontraída e descomprometida e dou mais um passeio com algumas paragens para ver e absorver esta fantástica cidade e as suas rotinas.
Findo o passeio, regresso ao hotel para poder recolher a bagagem e ainda tomar um banho antes de ir para o aeroporto. Tiro as roupas que preciso e vou para a casa de banho que a senhora do hotel gentilmente me indicou. Ao entrar reparo que não tem luz. Experimento os vários interruptores e nada. Procuro outros que possam estar escondidos e nada... Venho cá fora e falo-lhe do problema, e ela imediatamente me pede desculpa e diz que a luz está fundida e que se tinha esquecido. Procura numa das gavetas, tira uma lanterna e mete-a na casa de banho. Problema resolvido...
Já no transfer para o aeroporto providenciado pelo hotel o motorista pergunta-me: _ Iú fálai Vet Nám? _ Respondo que sim e lá vamos nós ainda com bastante antecedência para o aeroporto. Como não conheço bem o aeroporto, prefiro jogar pelo seguro.
O aeroporto de Luang Prabang é bastante pequeno e de fácil acesso a partir da cidade, que por não ser muito grande não tem quaisquer complicações de trânsito. Chego cedo e vou para o balcão do checkin, que está vazio. Entrego a bagagem e vou para o controlo de segurança que também não tem quase ninguém. Em poucos minutos estou dentro do terminal à espera do meu vôo, das 19h55, que deve saír daí a quase 3h. É então que reparo nos monitores e descubro que nesse dia vão apenas saír 2 vôos, e não admira que o aeroporto esteja tão vazio.
Eram cerca de 18h45 quando fazem mais um anúncio pelos altifanlantes do aeroporto. Dado faltar ainda algum tempo e estar tão embrenhado na minha leitura não tomei a devida atenção ao aviso. 10 minutos depois, um novo aviso, mas desta vez ouço o meu nome. Percebo que estavam a chamar por mim... Corro para a porta e já tinham embarcado toda a gente e estavam à minha espera. Indicam-me o caminha pela pista até ao meu avião, da Vietnam Airlines que estava parado relativamente perto. Um avião pequeno, com duas hélices e cuja tripulação me aguarda cá fora. Entro e reparo que mesmo pequeno, está bastante vazio e no total devemos ser uns 11 passageiros. O piloto liga o motor da direita, depois o da esquerda, e às 19h05 partimos... 50 minutos antes da hora prevista.
Irão I - De Teerão a Xiraz
One's destination is never a place, but a new way of seeing things.
Henry Miller
O sonho era antigo! O Irão sempre me despertou interesse e depois daquela conversa com o Chico que tinha acabado de conhecer em 2003 ficou decidido. Tenho de ir...
O Chico tinha acabado de chegar de uma grande viagem ao Irão. Vinha em êxtase e com relatos fantásticos. "Foi a viagem da minha vida", disse-me, e depois de tudo o que ouvi, não restavam mesmo dúvidas. Dias depois empresta-me o seu guia de viagem, e está dado o sinal de partida.
Passaram-se mais de 10 anos até chegar o momento e a oportunidade que tanto desejei. Valeu a espera e esta foi mesmo a melhor altura.
Tudo começa na embaixada da República Islâmica do Irão em Lisboa, com o pedido do visto de turismo. Ao contrário da maioria das embaixadas, fui extremamente bem recebido e com a sensação que tudo fariam para me ajudar. Uma boa amostra do que é verdadeiramente o povo Iraniano. Dias depois estava de regresso para levantar o visto e... Tão feliz!!!
O nome Irão deriva do Persa "Eran", que vem do termo Aryan e que significa a terra dos Nobres. Foi usado pela primeira vez no 1º milénio AC e ainda hoje continua a fazer sentido a sua origem.
Teerão
Chego ao aeroporto internacional de Teerão Imam Khomeini bastante cedo, por volta das 6h da manhã. Viagem tranquila e não muito longa, com escala em Istambul. Como em todos os aeroportos, a esta hora ainda não há muita actividade e isso reflecte-se noutros serviços, como por exemplo o controlo dos passaportes. Chego à sala e dos muitos pontos de controlo apenas uns 4 ou 5 estão abertos. Procuro a fila correcta mas todas dizem "Cidadãos Iranianos"... Fico confuso, revejo os paineis informativos e opto por uma das filas ao acaso. Tenho sorte, pois passado muito tempo começam a canalizar todos os estrangeiros para a minha fila, que era a única que os estava a aceitar. Por outro lado, tenho azar e apanho o guarda mais preguiçoso delas todas, e era de longe a mais lenta.
Dadas as sanções a que está sujeito, o Irão está fora do sistema monetário internacional e isso faz com que nenhum dos cartões bancários estrangeiros seja aceite no país. Esta situação leva a que tenhamos de trazer todo o dinheiro que precisamos para a nossa estadia. As boas notícias é que os Euros são aceites na grande maioria dos hoteis, e em todo o lado é bastante fácil trocar Euros por Rials.
Assim, e depois de levantar a bagagem lá me dirijo eu para o único estabelecimento de câmbio que encontrei de modo a poder trocar alguns Euros para os primeiros dias e até mesmo para a viagem de taxi até ao centro de Teerão.
Na fila do Câmbio sou abordado por Mehdi, que se encontrava nas imediações. Oferece-me ajuda para preencher o impresso para a troca do dinheiro, que estava todo em Farsi e sem qualquer tradução para Inglês e depois auxilia-me na comunicações com a senhora da caixa. Troco o dinheiro e logo se oferece para me levar a Teerão. Falamos sobre as vantagens ou não de apanhar um taxi normal e no final lá venceu. Seguimos para o parque e para o seu carro pessoal.
Mehdi trabalha no aeroporto e costuma transportar turistas para a cidade no final dos seus turnos de modo a poder ganhar algum dinheiro extra e ter uma ajuda para as despesas do transporte. É bastante simpático e temos tempo para uma boa e animada conversa no caminho para o centro da cidade que dista uns bons 50Km.
À medida que nos aproximamos do centro o trânsito vai ficando cada vez mais caótico. 4 faixas de rodagem que funcionam como 6, prioridades aos mais destemidos e uma infinidade de regras que não consegui perceber. Mehdi pergunta-me o porquê da minha ida ao Irão e se já conhecia os países da região. Fala-me do seu país, da cidade, de futebol e de Fátima. Conta-me que uns dias antes tinha visto um programa sobre a cidade portuguesa de Fátima, nome da filha do profeta Maomé e como era incrível o facto de Fátima, filha de Maomé ter aparecido tanto tempo depois em Portugal para dar uma mensagem àqueles meninos. Fátima disse-lhes que tinham de contar na sua aldeia que a tinham visto caso contrário morreriam, o que acabou por acontecer...
Quase 2h depois, chegamos ao meu hotel, bem no coração da cidade.
Teerão, capital do Irão é uma metrópole que conta com quase 9 milhões habitantes e que ascendem aos 16 milhões se considerarmos toda a área metropolitana. É uma cidade imensa, não é bonita e sofre de graves problemas de trânsito e poluição, que dão todo aquele aspecto sujo aos edifícios.
Ainda assim, não deixa de ser uma cidade interessante com toda aquela vivência e energia e muito rica em termos culturais.
A primeira impressão que nos passa é que Teerão é ainda uma cidade muito tradicional, com os seus mercados e toda uma diversidade de lojas de rua que já começam a não ser muito comuns nos dias que correm. Pequenas papelarias, lojas de carimbos e medalhas, máquinas de escrever, ferragens, tecidos, etc. Pelo meio vamos encontrando pequenos cafés e restaurantes de fast-food Iraniano. Nas ruas, um trânsito caótico e barulhento e muitas vezes os passeios têm de ser partilhados com as motos, carros de mão e vendedores ambulantes.
O primeiro dia em Teerão começa com uma visita à zona mais a sul onde estão concentrados alguns dos pontos mais interessantes. Dista apenas alguns Kms e nada melhor que uma caminhada pela Ferdosi St até lá.
Começo pelo Bazaar e pelo seu emaranhado de ruas apertadas repletas de comercio típico deste tipo de estruturas. É um mercado muito tradicional mas que no fundo não difere muito de outros mercados do género que já visitei.
A grande vantagem deste Bazaar e um pouco à semelhança do que se passa no resto do país, é que os vendedores não nos estão constantemente a abordar para vender todo o tipo de produtos. Apenas nos consultam quando vêem que temos interesse em algum produto.
A azáfama estende-se ao exterior do Bazaar e nas ruas circundantes há também uma infinidade de lojas e vendores ambulantes.
Junto ao Bazaar fica também uma das mais conhecidas e frequentadas Mesquitas de Teerão, a Mesquita Imam Khomeini. Este templo, semelhante aos restantes contém um páteo central com um pequeno lago no meio, e é ladeado por vário edifícios de suporte, o edifício principal num dos topos e o da entrada no topo oposto.
Não muito distante fica o palácio de Golestan, que na realidade é um complexo de edifícios em volta de um jardim muito bem cuidado. Os edifícios, cada um com o seu propósito são bastante interessantes, com aquitecturas distintas resultantes das várias fases de construção e, nalguns casos, ispirados em palácios europeus com ideias trazidas por Nasser al-Din Shah.
No regresso uma passagem pelo belíssimo parque e-Shahr e almoço num dos mais típicos restaurantes da cidade, o Sofreh Khane Sonnati Sangalag.
Uma das particularidades da cidade de Teerão, é que se encontra colada à cordilheira de montanhas Alborz, uma extensa cadeia de montanhas que ultrapassa em muitos pontos os 4000m. Toda a cidade tem como pano de fundo esta parede de montanhas e os seus picos cobertos de neve, num cenário muiro parecido com Santiago do Chile e os Andes.
Este facto faz com que a zona norte, no sopé das montanhas e de terreno um pouco mais acidentado, esteja a uma altitude um pouco mais elevada que o resto da cidade e lhe proporcione uma vista panorâmica muito interessante sobre toda Teerão. É também aqui que vive toda a classe média/alta Iraniana e onde podem ser encontrada uma infinidade de condomínios e edifícios bastante mais bonitos que os que se encontram no centro. É também uma uma zona com muito mais vida, mais restaurantes, cafés e espaços de lazer e diversão.
É aqui, e já na encosta da montanha que fica o lindíssimo parque Jamshidiyeh, um dos refúgios das pessoas de Teerão, que aqui acorrem em busca de alguma tranquilidade e acima de tudo de algum ar puro, fora do intenso smog que muitas vezes cobre toda a cidade. Essa foi uma das razões que me levou ao parque, pois ao 3º dia em Teerão já sentia o nariz a inflamar...
A melhor forma de chegar ao extremo norte da cidade é através do metro que nos deixa em Tajrish, na zona alta. A caminho do metro foi possível visitar ainda a Catedral Sarkis, cujo interesse não é tanto pela sua arquitectura mas sim por se tratar de uma catedral cristã no coração de uma república islâmica.
O metro de Teerão é relativamente recente e é um sistema bastante moderno, eficiente e confortável. Isto contrasta com o que se passa à superfície o que faz com o que o metro seja sempre a melhor opção e esteja praticamente lotado durante a quase totalidade do seu horário de funcionamento. Entro na estação de Haft-e-Tir, compro um bilhete de ida e volta e lá vou eu com destino a Tajrish.
Ainda que a circulação se faça com muito mais facilidade, dentro das carruagens do metro o reboliço é o mesmo da rua. Vendedores ambulantes passam frequentemente e serpenteiam pelo meio dos passageiros a vender de tudo um pouco. Isqueiros, meias, mochilas, pastilhas, bolachas, capas de telemóvel, cabos, chinelos, brinquedos, tudo, tudo, tudo...
Já a meio da viagem reparo na hora do relógio do metro. Olho para o meu relógio e marca 1h a menos... Fico confuso! É verdade que estou de férias e até aqui não tinha precisado de cumprir qualquer horário, mas será que andei 3 dias a seguir a hora errada? Olho para o telemóvel do senhor do lado... Marca o mesmo que o meu, e é mesmo o relógio do metro que está mal...
Do metro de Tajsrish até ao parque são cerca de 4Km e com uma inclinação algo acentuada. Opto por ir de taxi até lá e voltar a pé que é mais fácil e assim conhecer também a zona.
Jamshidiyeh é de facto um parque muito bonito e agradável e vale muito pelo ar puro que nele se respira. É conhecido também por ter vistas fantásticas sobre a cidade nos dias de tempo mais limpo, mas infelizmente, com o smog que paira sobre ela nem consigo ver os prédios mais próximos. Apenas uma nuvem castanha se consegue observar lá em baixo.
O dia está lindo e é de facto um prazer poder usufruir do parque e dos seus trilhos na sua plenitude. No final, mais uma caminhada de regresso à malha urbana e... Ao trânsito!
Um dos dias passados em Teerão foi dedicado inteiramente à cultura e começou com uma visita ao Museu de Arte Contemporânea. O museu não é muito grande mas é interessante não só pelas obras que tem mas também pelo próprio edifício que no interior é bastante singular. Eu tive a sorte ainda de ser presenteado com uma exposição temporária de uma artista Iraniana Farideh Lashai.
Farideh nasceu em 1944 e foi pintora, escritora, tradutora e ainda se dedicou à criação de peças em cerâmica e em vidro. Faleceu em 2013 e foi uma daquelas pessoas com um talento incrível e que se destacou fortemente nas várias áreas a que se dedicou. A exposição é lindíssima e uma das melhores que já visitei.
No Parque Honar Mandan fica outro dos grandes polos culturais Iranianos, a Casa dos Artistas. Este edifício emblemático alberga oito galerias, vários espaços comerciais ligados às artes e ainda um restaurante e um lindíssimo café. No parque e na zona em redor estão expostas várias obras também de grande interesse.
O último passeio em Teerão foi dedicado de novo à parte norte e à zona de Darband. Darband é um grande parque com vários museus e palácios na encosta das Alborz e estende-se ao interior da montanha por um vale também ele bastante procurado pelas gentes da cidade que aqui procuram alguma tranquilidade e ar puro.
Aproveitando o feriado religioso em que na cidade está praticamente tudo fechado, apanho de novo o metro até Tajrish e inicio a minha subida de alguns Kms até ao parque. O dia está bastante frio e na zona ainda existem bastantes resquícios de neve do nevão que caíu há alguns dias. Ao chegar à entrada do parque dou com o portão principal fechado. Pergunto ao guarda que me diz que que neste dia não abre por causa do feriado...
De modo a não desperdiçar o passeio até ali decido continuar pela estrada que dá acesso ao vale e ao trilho que entra na montanha. Alguns Kms mais acima a estrada acaba, no acesso ao teleférico que liga a cidade às estâncias de ski, mas segue o trilho que nos leva a Pas-e-Qaleh através de um lindíssimo vale. O trilho, acompanhado por um riacho, está ladeado de cafés, restaurantes e lojas de doces. Este é de facto um local muito frenquentado e a multidão é grande.
O trilho vai serpenteando pelo meio dos pequenos edifícios, cruza e descruza o riacho, sobe escadas e mais escadas, contorna rochedos e parece não ter fim. Cruzo-me com todo o tipo de pessoas, desde os montanhistas altamente equipados aos casais de namorados com roupa de fim-de-semana... À medida que vou progredindo o número de pessoas também vai diminuindo tal como a temperatura que se sente a baixar. A neve aumenta e a paisagem começa gradulamente a passar do verde ao branco. As condições do trilho também se começam a degradar, com mais lama e gelo, e muitas vezes com o piso em muito mau estado.
Subi até atingir Pas-e-Qaleh, que já está nos 2000m. O piso fica então impossível, com muito gelo e sem aderência. As minhas botas de caminhada não parecem preparadas para o gelo e depois de assistir a várias quedas ao meu lado decidi voltar para trás.
Mais algums Kms até Tajrish e o regresso ao centro de Teerão.
Kashan
Depois de alguns dias em Teerão decido então partir à descoberta das restantes cidades Iranianas, num trajecto que já havia estudado anteriormente. A primeira cidade é Kashan, a cerca de 200Km e 3h30 de autocarro.
A grande maioria dos autocarros com destino ao sul saem do terminal e-Jonub, no sul de Teerão. A melhor forma de chegar ao terminal é de metro o que, tendo em conta que ia viajar com uma mochila enorme às costas, pode ser um problema nas horas de ponta em que o metro circula apinhado. Assim, decido ir um pouco mais tarde e aproveitar o tempo para descansar e tomar um bom pequeno almoço mais descontraído. Faço check-out e por volta das 10h30 da manhã lá vou eu de encontro à estação de metro Taleqani. Um dos grandes problemas de cidades com esta dimensão, é que mesmo fora das horas de ponta, continua a ser hora de ponta, e o metro continuava bastante cheio. Valeu a grande simpatia dos Iranianos que prontamente me abriram a passagem e se apertaram mais para abrir um espaço para mim e para a minha mochila.
Um longo mas arejado tunel liga a estação de metro ao grande terminal circular de autocarros e-Jonub. A toda a volta do edifício várias dezenas de autocarros coloridos estão em preparação para a partida e rodeiam-se daquela grande agitação característica destes locais. Motoristas que chamam pelos seus passageiros, vendedores ambulantes que entram e saem dos autocarros, passageiros que procuram o seu devido transporte...
Subo ao primeiro piso em busca da bilheteira da companhia que gere a linha até Kashan. Dificuldade número 1, tudo está escrito em Farsi e fico sem saber para onde ir. Decido perguntar e muito prontamente me indicam o número da bilheteira. No Irão, todos sempre prontamente dispostos a ajudar.
Já no balcão, peço o meu bilhete e indicam-me que pague no caixa, um senhor que estava ao fundo e no topo direito do mesmo. Estava bastante ocupado e ao telefone e fico a aguardar. De repente alguém me puxa e começar a chamar: "Sir, come!". Corremos os dois escadas abaixo e entrega-me ao motorista de um dos autocarros que estava mesmo para partir. Deixo a mochila em baixo, entro, e sento-me onde me indicam. Quanto ao bilhete, deve ser cobrado depois já lá dentro.
A política de atribuição de lugares nos transportes no Irão obedece a algumas regras de modo a não juntar mulheres com homens desconhecidos. Depois de já ter reparado que o metro possui carruagens exclusivas para mulheres, ainda que elas possam livremente circular nas restantes, no autocarro foram necessários alguns ajustes para que eu me pudesse sentar. Cada fila de lugares no autocarro possuía três bancos, dois de um lado e um do outro, sendo que o único lugar livre estava no lado que tinha dois lugares e ao lado de uma senhora. O ajudante do motorista imediatamente troca um rapaz que estava sentado sozinho para onde estava a senhora e senta-me ao lado dele. A senhora pode assim seguir sozinha também no lugar que era do rapaz.
Tudo arranjado e instalado e seguimos viagem. Cerca de 3 horas depois, chegamos a Kashan.
O autocarro tem normalmente duas paragens em Kashan, a primeira em Montazeri Sq e a segunda em Valiasr Sq. Desconhecendo qual das duas seria a melhor, saio na primeira paragem e tento perguntar ao rapaz que me tinha ajudado com o lugar se seria aquela a melhor. Ele ao ver-me sair vem logo ter comigo e empurra-me de novo para dentro do autocarro, dizendo que era na próxima. Estranho, pois ele não fazia ideia para que zona da cidade eu pretendia ir, mas decidi confiar.
Na saída seguinte, lá vem prontamente o rapaz para me encaminhar. Dá-me a minha bagagem e entrega-me a um motorista de táxi que percebo que devia ser conhecido dele. Aí percebo o porquê da preferência na paragem... Motorista simpático, arruma a mochila na mala e seguimos. Já em andamento pergunta-me qual o hotel destino num inglês bastante básico e sempre com um sorriso simpático. Respondo e ele prontamente entende qual é. Na realidade em Kashan não existem muitos hotéis e é fácil descobrir qual o destino.
Ainda não tínhamos feito mais de umas centenas de metros, quando o motorista, ao mesmo tempo que puxa de um cigarro me pergunta: _ Iran good? _ Resposta: _ Iran very good! Sorri e pergunta-me sobre a minha origem. _ Portugal good? Iran people good?
A cidade de Kashan, localizada numa das extremidades do deserto Dash-e-Kavir é uma cidade bastante encantadora e interessante. É conhecida pela sua arquitectura e pelas suas casas tradicionais, pela atmosfera envolvente do seu Bazaar e por ter cativado ao longo dos anos um sem número de personalidades Iranianas.
As casas tradicionais Iranianas estendem-se sempre ao redor de um grande pátio central, sempre com um lago no meio, e distinguem-se pelo facto de que todas as divisões dão directamente para este pátio e não possuem janelas ou portas para o exterior, com a excepção da entrada principal. Em muitas das cidades Iranianas estes edifícios estão a ser convertidos em hotéis e com muito sucesso. Em Kashan tive a minha primeira experiência num hotel do género.
Bem no centro fica a mesquita Masjed-e Agha Bozorg famosa pelo seu design simétrico, pelo seu pátio desnivelado e tectos trabalhados. Diz-se que a porta principal tem tantos pregos quantos versos tem o Alcorão.
É comum no Irão, e em especial em Kashan, as portas da rua das casas terem dois batentes. Um mais arredondado e volumoso, e outro mais longo e fino, de modo a produzirem sons diferentes e a identificar a pessoa que está a bater, se é homem ou mulher. Consoante um ou outro também será uma pessoa diferente a atender.
Um pouco mais a sul do centro histórico, está localizada uma estrutura que logo me despertou interesse. Trata-se da antiga muralha que cercava a cidade, e que num dos extremos forma mesmo um circulo perfeito. A muralha está a ser recuperada mas ainda está bastante degradada. O interior do círculo, cujo acesso é feito apenas por uma entrada, está a ser usado para agricultura, talvez por estar protegido dos ventos secos do deserto. Junto à muralha existe ainda uma antiga cisterna também ela bastante degradada.
O histórico Bazaar de Kashan é um dos mais interessantes no Irão. Longe daqueles Bazaars imensos e labirínticos, o de Kashan apresenta o tamanho ideal para ser bem explorado e é bastante rico em termos históricos. As suas abóbadas e cúpulas devidamente trabalhadas datam do séc. XIX, mas Kashan tem sido um centro de comércio há perto de 800 anos. Por entre ruas, becos e ruelas encontram-se mesquitas, caravançarais (antigas pousadas para albergar viajantes, muito populares no médio oriente), Madrasehs (espécie de seminários) e Hammams (banhos públicos).
Está também longe de ser caótico o que nos permite usufruir e sentir todos os espaços de uma forma muito mais intensa. É um Bazaar também com muito pouco contacto com turistas e somos portanto bastante acarinhados por todos os comerciantes, que várias vezes meteram conversa comigo por ser forasteiro. Repetidamente a mesma preocupação, se estava a gostar e qual a minha opinião sobre o Irão.
Nas portas da cidade fica um dos mais antigos e ricos espaços arqueológicos do país, Tappeh-ye Seyalk. Nele foram encontrados achados em porcelana, metal, osso e pedra e os mais antigos pensa-se que possam ser de 4000 ac. Escavações revelam também ruínas de um antigo tempo e vários edifícios, que dada a forma como eram construídos hoje parecem apenas pequenos montes de terra.
Na ultima noite decido experimentar o tradicional Abbasi Teahouse & Restaurant, numa das tradicionais casas de Kashan. O Abbasi é um lindíssimo restaurante que aproveita todo o pátio da casa e cujos espaços de refeição estão distribuídos em volta de um pequeno lago com um chafariz. Os espaços são pequenas plataformas cobertas com os tradicionais tapetes persas e algumas almofadas e onde as famílias e/ou amigos se reúnem para tomar as refeições ou apenas chá. É tradicional comer-se no chão e como tal os pratos são colocados no próprio tapete.
Eu, ainda muito pouco habituado a essa posição para as refeições, optei por uma das muitos poucas mesas que existiam no restaurante. Seguindo a sugestão do empregado, provei o Shevid chelov com goosht loobia, uma espécie de caldo com feijão e borrego acompanhado de arroz com ervas aromáticas e açafrão e também uma pequena salada com folhas de menta.
Durante o tempo de espera pelos pratos, o empregado curioso, volta e pergunta-me de onde sou. Sou na verdade o único estrangeiro ali o que se nota também pelo facto de ser a única pessoa instalada numa mesa.
Já havia notado que é habitual alguns restaurantes terem um espaço com várias bandeiras de vários países e este era um deles. Depois de saber a minha origem, não demorou 1 minuto até aparecer o empregado todo sorridente com a bandeira de Portugal.
Muito bom o restaurante e o meu prato muito delicioso mesmo, tendo-se tratado de uma muito boa opção. No final pago, não me aceitam a gorjeta e ainda me oferecem um presente, um quadro do restaurante e um folheto com a história do local.
Finda a visita a Kashan, o plano era de seguir para Esfahan mas com uma paragem em Abyaneh, uma típica aldeia que se encontra a cerca de 80Km de Kashan. O problema é que não existem transportes regulares e bons para Abyaneh o que tornaria a visita complicada e demorada. A solução passaria por ir de táxi mas neste caso tornar-se-ia bastante dispendiosa, cerca de 10 vezes mais que o autocarro de Kashan a Esfahan.
Durante a estadia em Kashan fui abordado por um senhor que tinha uma agência de circuitos turísticos e que na altura me entregou um cartão com os contactos e alguns trajectos. Meto a mão ao bolso e ainda tinha o cartão... Ao virá-lo descubro que fazem este trajecto e decido contactá-lo. Explico que quero ir de Kashan a Esfahan e parar umas horas no meio em Abyaneh. Responde-me que é possível, que me leva no carro dele, um bom carro e que me faz um desconto. 40€ o total, com mais de 250 Km e ainda esperava por mim em Abyaneh. Perfeito!
No dia seguinte, levanto-me cedo, e tomo o meu pequeno almoço típico, composto por com chá, pão Lavash, compotas e queijo. Repito a dose de Lavash... É provavelmente dos melhores pães que já comi.
Findo o pequeno almoço, sigo para o ponto de encontro com o senhor da agência.
O senhor já estava à minha espera e diz-me que não pode ser ele a levar-me mas que não há problema, que vou com a irmã. Metemos a mochila no carro e seguimos até à casa da minha nova motorista para a apanhar.
Saem a irmã do senhor da agência com a filha, a pequena Fátima, e a mãe. Pergunta-me se não há problema de levar a filha e a mãe. Claro que não, respondo, pois reconheço que não é fácil fazer depois a viagem de regresso sozinha. E na realidade, saí a ganhar... Bem bonita a minha nova motorista...
Deixamos a cidade e rumamos a sul. À saída, várias placas começam a indicar a auto-estrada que segue com direcção a Esfahan e por onde devíamos seguir. Passamos o acesso e não entramos na auto-estrada. Seguimos pela mesma estrada, apanhamos uma estrada secundária, e quilómetros mais à frente saímos para uma ainda mais estreita e em piores condições. Andamos um pouco, passamos por baixo da autoestrada, invertemos, apanhamos um atalho de terra batida, e entramos na auto-estrada. Assim evitámos a portagem!
A viagem decorre de forma bastante tranquila, sem trânsito. É sexta-feira, o equivalente ao domingo europeu e tanto na cidade como fora há bastante menos trânsito. Viajamos deserto fora, numa paisagem árida e monótona. Uma cordilheira de montanhas, acompanha-nos no nosso lado direito e algumas com os picos cobertos de neve. Fátima vai alternando entre os jogos no tablet, as brincadeiras com a mãe, a avó e até comigo. A mãe vai-se desculpando mas não há qualquer problema.
De repente, no meio de nada surge um enorme complexo. "Athomic", diz-me a minha motorista ao mesmo tempo que aponta. Trata-se de uma central de enriquecimento de urânio, uma das que tanta polémica criou há alguns anos. Entre a estrada e o complexo estão alguns montes de terra estrategicamente colocados para impedir os olhares curiosos. É então que saímos para a estrada secundária que nos vai levar a Abyaneh e que dá também acesso à central. Passamos na entrada e repado no enorme aparato militar, com postos de vigia, abrigos, mísseis e anti-mísseis...
Começamos a entrar nas montanhas e seguimos por um vale também ele bastante seco. Passados alguns momentos chegamos a Hanjan, uma pequena aldeia conhecida pelas ruínas do seu antigo castelo .
A estrada vai serpenteando por entre vales e penhascos e a pouco e pouco vamos subindo a montanha. Apesar do dia de sol a temperatura vai baixando gradualmente e começamos a ver aqui e ali, nas zonas de sombra alguma neve que ainda resiste. Não tardou muito a chegarmos a Abyaneh.
Abyaneh
Caracterizada pelo seu tom avermelhado, a aldeia de Abyaneh é uma das mais antigas e típicas do Irão e atrai um grande número de turistas nacionais e estrageiros. As suas ruas apertadas e irregulares, a arquitectura tradicional e as vestes das duas gentes fazem desta, uma das mais especiais aldeias que conheci.
Estacionamos na entrada da aldeia e parto a pé à descoberta. Nada como me perder no meio daquele casario e ir explorando...
Passo cerca de 2 horas na aldeia, mas sabe a pouco. A muito pouco... Apetece ficar ali, pernoitar, uns dias. Apetece sentir mais, contactar mais com aquelas pessoas, explorar mais, ali e à volta daquela natureza. Desta vez não vai ser possível, na próxima será...
À saída fazemos algumas compras de alguns produtos típicos e partimos com destino a Esfahan. Voltamos pela mesma estrada na montanha e já em baixo seguimos desta vez pela estrada nacional até Natanz onde voltamos a apanhar a auto-estrada.
Ainda em Natanz fazemos uma pequena paragem e a avó de Fátima sai para lavar algumas frutas e legumes que tinha comprado. Já durante a viagem oeferece-me um pepino já descascado e um diospiro. Já tinha alguma fome sim, e souberam-me muito bem.
A viagem até Esfahan durou pouco mais de duas horas. Deixam-me mesmo no centro da cidade e junto ao meu hotel. Agradeço e despeço-me desta família que neste dia também foi minha.
Esfahan
Principal destino turístico do país, Esfahan chegou a ser uma das maiores cidades do mundo, tendo sido até capital da Pérsia por duas vezes. Ainda hoje são muitos os sinais da sua glória, através das suas boulevards ladeadas de árvores, pontes cobertas, palácios, jardins persas, mesquitas e minaretes, todos eles ricos em arquitectura islâmica. Toda esta grandiosidade levou à criação de um proverbio persa muito conhecido, "Esfahān nesf-e- jahān ast" ou Esfahan é metade do mundo.
Naqsh-e Jahan significa o Padrão do Mundo e é o nome da principal praça de Esfahan e onde se localizam alguns dos principais monumentos. Começo a minha visita pelo extremo norte da praça e pela principal porta de acesso ao Bazaar, Qeysarieh Portal.
O histórico Bazar-e Bozorg, o grande bazaar de Esfahan é um dos mais fascinantes do Irão e liga a grande praça de Naqsh-e Jahan à mesquita Masjed-e Jameh, 1.7 Km mais a norte. Possui dezenas de entradas e uma grandeza arquitectónica bastante grande. Ainda que grande parte do bazaar seja mais recente, algumas das partes mais antigas e em especial nas imediações da mesquita têm mais de mil anos.
Começo pelo mercado das especiarias, sempre o meu preferido, e deixo-me ir naquele misto de cheiros, cor e confusão. Os bazaars são sempre locais de grandes sensações e grande agitação.
A entrada para a mesquita Masjed-e Jameh aparece disfarçada no meio do bazaar. Passo por ela sem perceber e sigo. Mais à frente apercebo-me que já andei demasiado e tento por um outro caminho. Dou de caras com as traseiras da mesquita e com uma entrada encerrada. Contorno, entro de novo na rua principal do bazaar e volto a passar pela mesma entrada. Desta vez já não me engano, só pode ser ali...
Masjed-e Jameh é um grande complexo que contém mais de 800 anos de design e arquitectura islâmica. É considerada a maior mesquita do Irão e deslumbra pela sua elegância geométrica, pela grandeza e diversidade dos espaços.
É tempo de voltar à grande e luminosa praça Naqsh-e Jahan. Sigo através da Majlesi St, atravesso a grande praça Ghiyam e entro na Moshir Alley. Do lado direito o minarete mais alto da cidade, na Mesquita Ali. Do lado direito, a Mesquita Haroonieh. Um pouco mais à frente volto a entrar no bazaar e alguns minutos depois estou de regresso a Naqsh-e Jahan.
Do lado nascente da praça fica a lindíssima Masjed-e Sheikh Lotfollah, uma importante mesquita caracterizada pelos seus reluzentes azulejos em tons de azul e com designs perfeitamente simétricos. A sua lindíssima entrada e a sua cúpula abrilhantam toda a praça com as suas tonalidades e padrões.
No topo sul fica a cereja no topo do bolo, a impressionante Masjed-e Shah com o seu imponente portal elegantemente decorado com azulejos e padrões de uma harmonia sem igual. É o monumento mais fotografado do Irão e é fácil perceber porquê. A grandeza, a beleza e a magia deixam-nos completamente extasiados.
O interior é composto por um grande pátio central, com um grande lago e ladeado de santuários e Madrasehs, pequenas escolas para o estudo do Islão. Todos eles estão ricamente decorados com destaque para o santuário principal, que dada a sua imponência nos impressiona verdadeiramente. Padrões florais preenchem por completo todos os espaços e como que nos deixam sem ar com tamanha beleza. A principal cúpula é uma verdadeira obra-prima.
Um pouco mais discreto é o palácio Kakh-e Ali Qapu localizado no lado poente da praça. Este enorme palácio de seis andares serviu de residência a Shah Abbas no séc XVI e tem como ponto alto uma grande varanda com 18 elegantes colunas sobre a praça e de onde se pode obter uma bonita vista sobre a mesma.
A praça Naqsh-e Jahan, pelas suas características e beleza é um dos principais pontos de encontro das gentes de Esfahan que aqui se juntam para conviver, descansar e aproveitar o tempo livre, em especial ao fim do dia. É também o local ideal para o contacto com os locais e para absover muito da cultura da cidade. Sentei-me num banco para observar e captar aqueles momentos. Um senhor percebe que o estou a fotografar e à biclicleta dele. Sorri, mete-se em pose para mais algumas fotografias e senta-se ao meu lado. Não fala inglês mas conseguimos uma pequena conversa. Tira da algibeira uma maçã e um canivete, divide a maçã ao meio e oferece-me metade. Ficamos ali os dois a deliciarmo-nos com a maçã e com o ambiente da praça. No final, aquela despedida...
Não muito longe fica o palácio Khak-e Chehel Sotun, um elegante palácio rodeado de um lindíssimo jardim ao estilo persa. O acesso ao palácio é feito através de um elegante terraço que faz a ponte entre os jardins e o seu esplendido interior, e que possui 20 colunas devidamente trabalhadas. O grande hall do palácio está decorado com vários e belos frescos que representam vários pontos da história.
Bem no coração de Esfahan fica o parque Shahid Rajai, um grande parque verde muito utilizado para o lazer em especial pelas pessoas de mais idade, que aqui se juntam para jogar e confraternizar. No centro do parque e envolto em tranquilidade fica o palácio Hasht Behesht, com as suas características colunas em madeira e as suas varandas abertas a toda a volta.
Bastante interessantes também são as pontes históricas de Esfahan, verdadeiros monumentos e de arquitectura bastante singular. Comecei por Pol-e(ponte) Khaju, que com os seus 110 m funciona também como uma pequena barragem no rio Zayandeh. É também um dos locais mais procurados para o lazer na cidade, pela sua enorme escadaria, pela luz e pelo som da água a passar, bastante relaxante.
Cerca de 500 m a oeste fica a Pol-e Chubi, com os seus 21 arcos e 150m de comprimento. É uma ponte mais modesta e foi construída numa vertente mais funcional.
A maior e mais conhecida, pelo seu tamanho, localização e por ser a mais antiga, é Pol-e Si-o-Seh, com 33 arcos distribuídos ao lonfo dos seus 298m de comprimento. É também ela muito bonita e por ser um prolongamento da muito conhecida e concorrida avenida Abbasi torna-se na principal união entre as duas margens do Zayandeh.
Aproveitando a visita às pontes, atravesso o rio para visitar o bairro Arménio de Esfahan, o Jolfa. Na realidade Jolfa é o nome da cidade origem desta comunidade de Arménios no norte do Irão e que aqui foram realojados em massa por Shah Abbas I, ao saber das suas enormes qualidades como comerciantes, artesãos, empreendedores e artistas. Shah Abbas I reconhecia-lhes grandes capacidades e pretendia assim uma preciosa ajuda para a construção da grande capital Esfahan.
Jolfa é ainda hoje um bairro das elites e isso é visível logo à chegada, pelo tipo de comércio, pelos cafés e restaurantes bastante mais refinados e até pelo próprio estilo dos edifícios. Cheguei ainda cedo e depois de um passeio pelo bairro dirigi-me ao seu principal ponto turístico, a catedral Kelisa-ye Vank. A catedral está localizada numa estreita mas muito interessante rua, repleta de pequenos e acolhedores cafés, lojas de artesanato, livrarias e galerias de arte.
Vista de fora, a catedral é bastante simples e discreta, mas o seu interior está ricamente decorado numa mistura de arte Islâmica e Cristã e está ainda adornada com uns lindíssimos frescos que levaram mais de 15 anos a ser acabados.
Terminada a visita ao bairro Arménio estavam cumpridos os objectivos da visita a Esfahan. Tempo agora para preparar a viagem para o próximo destino e para alguns passeios mais descontraídos pela cidade.
Como apaixonado pelo deserto que sou, não poderia vir ao Irão sem fazer uma incursão pelo grande Dasht-e Kavir, um dos dois grandes desertos que dominam a paisagem Iraniana. Planeei assim uma estadia de duas noites em Garmeh, uma aldeia oásis perdida no interior deste gigante árido. Não existem transportes para lá, pelo que teria de apanhar um autocarro até Khoor, uma pequena vila a 30 Km de Garmeh e uma vez lá, tentar encontrar forma de chegar ao meu destino.
O autocarro para Khoor parte de Esfaham à 1h da tarde, o que me dá algum espaço para iniciar o meu dia e a viagem com calma. Tomo um pequeno almoço reforçado, troco alguns euros para rials, check-out, chamo um táxi e lá vou eu.
O taxista era um senhor velhote, ex-professor que agora conduzia táxis para poder ganhar algum dinheiro. Pergunta-me para onde quero ir, e respondo que para Kave, o grande terminal de autocarros de Esfahan, para apanhar o autocarro para Khoor. O senhor fica admirado e diz-me que os autocarros para Khoor não saem de Kave. Eu fico baralhado e digo-lhe que foi o que li. Ele insiste em ir para outro terminal, mas eu prefiro jogar pelo seguro e digo-lhe que vá para Kave, e no caso de não ser, como temos tempo podemos seguir para o outro. O senhor não fica convencido e começa a fazer telefonemas... Percebo que está a confirmar a origem dos autocarros, mas parece que ninguém sabe ao certo. Vamos mesmo para Kave...
O grande terminal de Kave possui várias áreas de embarque, com várias companhias e sem qualquer tipo de informação em inglês. Pergunto num balcão de informações e indicam-me a área correcta e o balcão da companhia que viaja para Khoor. Já no balcão, confirmo que estou no sítio certo e peço o meu bilhete. O senhor educadamente pede-me alguns dados pessoais para introduzir no sistema, recebe o dinheiro e imprime o meu bilhete. Sublinha o número da linha e a hora mas... Está tudo em Farsi. Ao ver a minha cara, apercebe-se do problema e escreve o número da forma que eu percebo, 17.
O relógio marca ainda 11h30 e tenho de esperar cerca de hora e meia. Passeio pelo terminal, visito algumas lojas e ainda me sobra tempo para o almoço. Nada como um tradicional Kebab de frango.
10 minutos antes da partida dirijo-me então para a linha 17. Várias pessoas estão agrupadas nas imediações das várias linhas, outras sentadas ao redor. Olham para mim com ar de surpresa. Não é comum haverem estrangeiros aqui. Olho para o moderno autocarro amarelo estacionado na linha e fico contente, pois parece bastante bom e confortável. Confirmo com um rapaz que está na entrada do autocarro se aquele é o que vai para Khoor e ele acena-me que não. Surpreso, digo-lhe que me indicaram aquela linha e ele, constrangido por não saber inglês e não me conseguir explicar chama-me e leva-me a outro autocarro, na linha 22.
Olho para o autocarro na linha 22 e digo para mim mesmo: _Não pode ser! _ Confirmo com outro rapaz vai entrando e saíndo deste autocarro e colocando algumas bagagens em baixo, e ele confirma. A viagem são 7 horas, e não há-de ser nada...
O rapaz chama-me e contorna o autocarro. Sigo-o e abre uma das portas para que meta a minha mochila. Já passa da hora e não há quaisquer sinais de partirmos entretanto.
Cerca de meia hora depois chega então um senhor, bem vestido e com muito bom ar. O rapaz começa a chamar toda a gente e vai sentando um a um no autocarro, seguindo as regras habituais. O senhor, o motorista, entra, faz os ultimos preparativos e partimos.
Deixamos Esfahan para trás e o deserto toma conta de nós. Mergulhamos naquela imensidão árida cuja monotonia apenas é interrompida de tempos a tempo por uma qualquer aldeia que por ali se perdeu, ou por uma ou outra montanha que parece ali ter sido colocada por engano. Vamos avançando, num ritmo melancólico e quase à mesma velocidade com que o motorista e o seu ajudante devoram canecas de chá.
Algumas horas depois fazemos uma pequena pausa em Anarak, uma típica aldeia do deserto Iraniano, e junto a um pequeno café/supermercado. Saio para comprar comida e tirar algumas fotografias do deserto, já quase ao por-do-sol.
Dentro do estabelecimento, as pessoas fazem fila para comprarem alguns snacks, enquanto que o ajudante do motorista repõe o seu stock de chá numa grande chaleira colocada à entrada. Compro também alguns snacks e uma água e minutos depois voltamos ao caminho para os 175 Kms restantes.
Garmeh
A noite já tinha caído por completo quando chegámos a Khoor. Paramos numa rotunda no centro da pequena vila e alguns dos passageiros começam a levantar-se, assim como eu, ao mesmo tempo que vou olhando lá para fora numa tentativa de perceber se será fácil apanhar uma táxi. Mal saio do autocarro um senhor já velhinho dirige-se a mim e como que adivinhando, diz: _Garmeh? _ Sorrio e respondo que sim. Vou buscar a mochila e ele faz-me sinal para que o siga.
Leva-me para o carro dele, estacionado ali bem perto e abre a mala para que coloque a mochila. Entramos e reparo no carro, que mesmo devendo alguns anos à sucata, parece que ainda funciona.
Reparo também no senhor, velhinho, ao mesmo tempo que avançamos lentamente por uma das ruas de Khoor. Com o cabelo totalmente branco tem ar de uma idade bastante avançada e como tal merecia já estar em casa a descansar com a família. Chegamos pouco depois a uma rotuna e viramos à esquerda, passados alguns metros viramos à direita e entramos numa estrada bastante estreita. Num instante somos absorvidos pela escuridão do deserto.
As fraquinhas luzes do carro iluminam poucos metros à nossa frente. O senhor centra o carro no traço descontínuo do meio da estrada e segue em silêncio. Não fala inglês e por isso não comunica, pelo menos dessa forma. A escuridão à nossa volta é total e assutadora e é então que reparo no céu, estrelado e com uma nitidez como nunca tinha visto. Parece uma imagem tirada de um qualquer filme de ficção científica passado no espaço. Milhares e milhares de estrelas a brilhar e com uma definição incrível. Não consigo parar de olhar...
O tempo e os quilómetros vão passando, e o escuro, o silêncio, aquele céu, e a magia do deserto começam-me inexplicavelmente a trazer memórias, pensamentos, momentos... Trazem-me saudade, nostalgia, trazem-me recordações. Fazem-me pensar, fazem-me reflectir. Emocionam-me.
Quase meia hora depois, deixamos a estrada por onde circulávamos e viramos à direita. Ao fundo, algumas luzes começam a aparecer e noto que estamos a ficar perto do destino. Volto a olhar para aquele senhor, para o seu ar terno, doce e tranquilo, e naquele momento decido chamá-lo de Joaquim. Joaquim é um nome muito querido para mim, era o nome do meu avô, e era o nome de uma pessoa que foi como que um 2º pai para mim... E eu nunca lhe disse...
Chegamos, e Joaquim diz-me: _ Garmeh! _ ao mesmo tempo que entra numa pequena e apertada rua da aldeia. Pergunto-lhe pela Gesthouse onde tinha feito a reserva, Ateshooni, e ele indica com a cabeça que sim e aponta em frente.
Deixo o carro, e o nosso momento e recolho a mochila. Pergunto quanto é, e Joaquim responde 200. Dou-lhe 300 e recebo um caloroso agradecimento com um brilho especial nos olhos daquele senhor. Eu é que agradeço!
À entrada da Ateshooni um rapaz corpulento lava o caminho com uma mangueira. Cumprimenta-me com um sorriso simpático e diz-me para entrar. Ao seu lado, Emil também se apresenta. Emil é um dinamarquês que tinha chegado um pouco antes e que estava a dar uma volta de reconhecimento. Lá dentro encontro um grupo de jovens Iranianos, já instalados e pergunto pela recepção. Indicam-me o local mas dizem que não está ninguém, que o melhor é esperar...
Ateshooni é uma espécie de Guesthouse num complexo de edifícios bem típicos destas aldeias do deserto, construídos essencialmente com lama. Foi criada por Maziar Ale Davoud, artista e músico Iraniano que depois de se saturar com o caos de Teerão se decidiu estabelecer neste oásis de onde é originária a sua família. Ateshooni fornece alojamento em quartos bem tradicionais e alimentação aos seus hóspedes com comida caseira e produtos locais, dando também emprego às gentes locais e dinamizando a economia.
Sentei-me um pouco à conversa com os jovens Iranianos, um grupo de amigos, vindos de Esfahan e que me dizem gostar muito deste refúgio que costumam procurar de tempos a tempos. A zona comum é composta por um pequeno páteo coberto e várias divisões laterais com uma decoração muito tradicional e acolhedora. Salas com os tradicionais tapetes persas onde podemos descansar, conviver e onde tomamos também as refeições. É impossível chegar e ficar indiferente perante um espaço tão encantador.
Não tardou até aparecer um rapaz que me ajudar a instalar. Mostra-me o quarto, uma pequena divisão com o tecto em arco, apenas com uma janela minúscula e de reboco tradicional, a casa de banho, as áreas comuns e explica-me os horários das refeições. Os corredores são estreitos e acidentados, com o chão em pedra e vários desníveis e degraus. As divisões quase não possuem janelas de modo a protegerem ao máximo o interior do calor extremo que se costuma fazer sentir no deserto.
Converso com alguns hóspedes quando é servido o jantar. E que jantar... Comida típica, muito bem confeccionada e muito, mas muito saborosa. Estou deliciado, com a comida, com o espaço, o ambiente, com a companhia.
No final continuamos a conversa, muito bem instalados e enquanto degustamos um saboroso chá. Maziar, sempre simpático junta-se a nós. A sua forte presença não passa despercebida, pela sua aura, pela sua energia e pela sua partilha. Conversamos, rimos, trocamos experiências e sobretudo continuamos a viajar...
É então que Maziar se levanta e vai buscar um tambor, de características iranianas, e se senta numa das pontas da sala. Instala-se confortavelmente e começa a tocar... Um ritmo constante, melancólico e encantador envolve-nos e deixa-nos deslumbrados. Passados alguns minutos junta-lhe o Didjeridu e prende um shaker no pé. Toca os três em simulatêneo e presenteia-nos com um dos momentos musicais mais marcantes que assisti. O ritmo hipnotizante, a envolvência da melodia, a magia do lugar, aquela energia... Ficamos como que extasiados e dormentes durante os largos minutos que durou toda aquela partilha. No final, a música continua do smartphone de Maziar e nós continuamos ali, em silêncio, ainda a digerir aquele êxtase por mais de uma hora...
Garmeh é uma aldeia anexada a um lindíssimo oásis e de onde nasce uma simbiose quase perfeita no vazio deste imenso deserto. Já dizia Antoine de Saint-Exupéry, que "O que dá beleza ao deserto é que esconde um poço de água em qualquer parte", em Garmeh, uma poderosa nascente de água escondida traz vida a esta comunidade que assim consegue manter os seus campos agrícolas e os seus animais.
Um grande número de tamareiras protege os campos do sol e dá ainda o fruto mais popular do deserto e que aqui tem um sabor divinal. São também populares as romãzeiras que vão alternando com os vários produtos hortícolas aqui produzidos.
Decido seguir o canal da água no sentido ascendente. Zigue-zague no meio dos campos e chego às traseiras do oásis, numa área mais seca e não aproveitada. O canal continua até à nascente, e é habitado aqui por alguns peixinhos que vão subindo e descendo em busca de alimento. A nascente, uma grande cavidade no sopé de um monte está escondida atrás de uma porta. Lá dentro um pequeno lado azul-esverdeado cintila com a pouca claridade que lá consegue chegar.
Não foi preciso muito tempo pelo oásis para perceber que as duas noites que tinha marcado na guesthouse era muito pouco. Esta magia, esta paz e o poder deste silêncio requerem mais. Aventuro-me alguns quilómetros pelo deserto adentro e rendo-me, perdido no silêncio absoluto decido ficar mais um dia.
Por volta do pôr-do-sol reúno-me com os Dinamarqueses para tirarmos algumas fotografias e para visitarmos um local que Emil tinha identificado como muito interessante para ver e fotografar o céu estrelado. O local fica no sopé da montanha e um pouco afastado da aldeia. O caminho até lá é bastante acidentado com várias escarpas resultantes da erosão da água, algumas subidas e descidas difíceis e terreno instável.
Chegamos ao anoitecer, visitamos as ruínas de uma antiga casa e esperamos pela noite. É então que percebemos que depois, na mais total escuridão, não vai ser possível fazer aquele difícil caminho de volta. A solução será seguirmos no sentido oposto, até encontrarmos a estrada principal, e depois percorrer a estrada até à aldeia. Ao fundo, e na direcção da estrada as luzes de uma outra aldeia a cerca de 15 Km começam levemente a cintilar. Uma boa referência para sabermos a direcção que devemos tomar.
A noite chega, e as estrelas também. Os fascínio mais uma vez apodera-se de mim e quase que fico com um torcicolo de tanto olhar para cima. Apetece-me ficar ali, deitado, a olhar aquele espectáculo a noite toda...
A hora do jantar aproxima-se, e infelizmente temos de partir. Mochilas às costas, telemóveis na mão a fazer de lanterna e seguimos em direcção às ténues luzes no horizonte que tínhamos identificado. O terreno é irregular e seguimos com bastante cuidado. As lanternas improvisadas não nos dão mais do que 2m à nossa frente. Subitamente chegamos a uma arriba de um pequeno rio, totalmente seco. Não conseguimos descer e tentamos contornar. Alguns metros mais à frente outra arriba. Voltamos para trás e tentamos mais à frente. Também não conseguimos. A escuridão é total, e o facto de não conseguirmos iluminar mais do que 2m não nos permite ter uma visão mais global do terreno e avaliarmos qual poderá ser o melhor caminho e mesmo se será possível ir ou não naquela direcção. É um cenário um pouco assustador mas não nos resta outra alternativa que a da tentativa e erro.
A pouco e pouco vamos evoluindo e encontramos uma pequena arriba menos inclinada que conseguimos descer. Seguimos pelo leito seco do riacho e finalmente encontramos terreno menos acidentado. Andamos e conseguimos chegar à estrada. Como prémio, mais um excelente e delicioso jantar.
O dia seguinte começa com mais um passeio e desta vez decido explorar a zona a oeste do oásis. Uma zona árida e muito marcada pela erosão. Não tem muito interesse, pelo que volto de novo ao oásis. Exploro novos locais e observo as gentes do deserto. Sento-me na sombra de uma árvore e ali fico a descansar e a meditar. Sinto-me a esvaziar, mais leve, mais puro.
Regresso à guesthouse para fazer a mudança. Quando tentei fazer a extensão para mais uma noite informaram-me que o edifício principal da guesthouse já não tinha quartos livres, pois iam receber um grande grupo de turistas. A única hipótese era de ir para um outro edifício que eles possuiam e que funcionava como dormitório. As condições eram inferiores, mas não tinha outra hipótese e este pequeno sacrifício seria banstante bem compensado.
Entro na guesthouse e deparo-me com uma grande agitação com gente a entrar e a saír, a percorrerem todas as salas com ar de curiosidade e até a visitarem os quartos. São turistas Iranianos que visitam a aldeia, o oásis e esta guesthouse que já possui alguma fama, tudo por causa de Maziar. Saio com a mochila às costas mais os colegas dinamarqueses que também decidiram ficar mais um dia, e já cá fora somos alvo da curiosidade dos Iranianos. Perguntam-nos de onde somos e de repente, dezenas de pessoas rodeiam-nos mortas de curiosidade ao verem estrangeiros ali. Há lugares no Irão onde o turismo é quase inexistente e a presença de estrangeiros é algo bastante exótico. Foi o que aconteceu ali e de repende todos aqueles turistas esqueceram a aldeia, o oásis, Ateshooni e tudo o resto. A verdadeira atracção éramos nós.
Sendo português a conversa voltou-se inevitavelmente para o futebol e para Carlos Queiroz, treinador da selecção Iraniana. Queiroz é uma espécie de Deus no Irão. "We love him", todos me dizem e há um respeito e uma admiração muito grande pelo treinador português. Ainda tentei explicar que em Portugal a opinião sobre ele não é a mesma, mas desisti, pois não queria desapontar tão simpáticas pessoas.
Alguns minutos depois chega o rapaz da Ateshooni para nos mostrar o dormitório e temos de os deixar...
Durante a hora de almoço decidimos visitar Arousan, uma aldeia vizinha, que imaginamos ter outro oásis. Arousan fica a cerca de 6 Km, distância que poderemos facilmente percorrer a pé. Deixamos passar a hora mais quente e com o sol mais forte e metemo-nos ao caminho. Caminhámos cerca de 1 Km quando começamos a ouvir uma mota a aproximar-se. Não demorou até que a mota, conduzida por um rapaz que não devia ter mais de 16 anos, chegasse junto a nós. O rapaz olha-nos com admiração e mesmo não falando inglês, tenta perguntar onde vamos. Tentamos explicar e a cara dele fica ainda mais admirada. Aponta na direcção de Arousan e diz que não há nada. "Nothing! Nada!" Dizemos que queremos ver e ele insiste que não há nada lá. Voltamos a insistir e o rapaz rende-se com cara de estupefacção. É então que aponta para a mota e nos oferece boleia. Somos 3, como ele 4. Olhamos uns para os outros... Porque não?!
A viagem dura cerca de 10 minutos até à aldeia. Pedimos ao rapaz para nos deixar na entrada da vila e seguimos a pé para explorar. Agradecemos, e o rapaz segue pela rua principal... Não tardou até que aparecesse junto a nós, desta vez acompanhado de um amigo e com uma mota nova. Coloca a mota no descanso no meio da estrada e diz-nos que quer tirar uma fotografia connosco. Alinha-nos atrás da mota e pede ao amigo para apanhar a mota em grande plano, connosco atrás. Reparamos que o rapaz está em êxtase. Arousan é uma aldeia modesta e na realidade nunca deve ter visto um turista. É um lugar remoto onde nada acontece e o facto de ali aparecerem 3 turistas e algo bastante excitante para o rapaz que ainda por cima nos trouxe. Parte de novo...
Durante o passeio pela aldeia o nosso novo amigo ainda passou mais algumas vezes por nós, cada vez com um amigo diferente. Ficámos com a impressão que estava a mostrar aos amigos todos os turistas que ele tinha trazido.
A aldeia vizinha de Garmeh, apesar da proximidade e de ser também um oásis não tinha o mesmo encanto e percebia-se o porquê de não ser visitada por turistas. Vários canais de água atravessam a aldeia e irrigam os campos de cultivo, mas com a diferença de que aqui, a nascente não era natural e a água era extraída de poços bastante profundos.
Atravessamos a aldeia e subimos uma pequena colina de onde conseguimos obter uma boa vista da aldeia e do deserto em redor, e sentamo-nos um pouco para descansar e comer umas frutas. Analiso o solo, mistura de areia e cascalho, e fico impressionado com a diversidade do tipo de rochas que consigo encontrar. No meio, encontro um pequeno seixo com sinais de erosão provocada pela água, mais à frente encontro um fóssil de uma concha.
Findo o passeio, e já perto no anoitecer decidimos voltar a Garmeh, mas não sem antes termos um novo encontro com o nosso amigo que nos veio oferecer boleia para o nosso regresso. Agradecemos mas dizermos que não há necessidade e que nos vai saber bem fazer o regresso a pé.
A noite abate-se sobre nós ainda a meio do caminho. Novamente o problema da falta de visibilidade, mas pelo menos agora seguimos pela estrada, bastante mais regular.
A despedida de Garmeh é feita de forma sublime, sendo a última noite passada sob o exotismo do deserto e à volta da fogueira num cenário magnífico e encantador. Mais uma interessante partilha de experiências, visões e opiniões de diferentes culturas. Mais uma noite memorável de encher a alma.
O autocarro para Yazd, o meu próximo destino, sai de Khoor às 7h da manhã, o que me obriga a deixar Garmeh pro volta das 6h30. Ateshooni arranja-me um taxi para me levar até Khoor e combinamos às 6h30 à porta do dormitório. À hora combinada lá estou eu e nada do taxi... Espero um pouco e decido ir até ao edifício principal da Ateshooni e também não o encontro. Espero, volto ao dormitório e de novo ao edifício principal. Quando regresso já lá está e traz-me o meu pequeno almoço gentilmente preparado pela guesthouse. Eram sete e pouco quando chegamos a Khoor onde o autocarro aguarda. Compro o bilhete, espero mais alguns minutos e partimos.
Não demorou muito até começar a ficar com fome, mas estava bem precavido com este miminho da Ateshooni.
A viagem dura cerca de 5 horas, sempre pelo meio do deserto e cercados daquela tonalidade amarela interrompida apenas aqui e ali por algumas montanhas. Teria sido tranquila não fosse uma criança, filha do casal sentado atrás de mim, andar a correr pelo corredor para trás e para a frente, parando muitas vezes na frente junto ao motorista no cimo dos degraus, e perante a indiferença dos pais. Passei grande parte da viagem em aflição, ao ver a criança ali desprotegida, mas não sabia se uma abordagem aos pais seria bem recebida. A situação só acabou quando entrámos na zona urbana de Yazd e quando uma pequena travagem levou a que o menino aterrasse de cabeça aos pés do motorista. Felizmente não se magoou muito...
Yazd
Situada entre os desertos de Dasht-e Kavir e Dasht-e Lut, Yazd é uma cidade de encantos. As suas labirínticas e estreitas ruas, as casas de terra e as torres de vento fazem desta cidade uma das mais interessantes do Irão. Muito conhecida pelas suas sedas, foi mesmo designada por Marco Polo como uma fina e esplêndida cidade, centro do comércio. Aqui vive também uma grande comunidade Zoroastriana.
Chego cedo à cidade e depois de fazer o check-in num bonito e tradicional hotel no coração do centro histórico ainda me sobrou algum tempo para passear. Começo pela concorrida rua Imam Khomeini até à Praça Beheshti, onde viro à esquerda para a Avenida Favardin, conhecida pela sua torre do relógio.
Logo a seguir fica um importante templo zoroastriano, Ateshkadeh. Os zoroastrianos dão uma importância vital ao fogo, e todos os seus templos são conhecidos como templos do fogo e têm sempre chamas acesas. Em Ateshkadeh, é possível ver uma pequena fogueira que se diz estar a arder desde o ano 470.
No regresso, uma passagem pelo complexo Amir Chakhmaq e pela sua mesquita, em preparações nesta altura para um importante evento religioso a acontecer dentro de dias.
Mesmo ao lado fica o Saheb A Zaman Club Zurkhaneh, a versão Iraniana de um ginásio construído dentro de uma antiga cisterna construída por volta de 1580. Este tipo de ginásios são populares pelos seus exercícios bastante singulares.
A rua Imam Khomeini é um importante ponto comercial da cidade, com pequenos comércios de ambos os lados e ainda com alguns edifícios bastante emblemáticos.
O centro de Yazd é a famosa rua Masjed-e Jameh, onde se localiza a famosa mesquita com o mesmo nome.
O segundo dia em Yazd começa cedo e com uma visita à elegante mesquita Masjed-e Jameh. A sua entrada forrada de azulejos é uma das mais altas do país, possuindo ainda dois minaretes de 48m de altura. O símbolo utilizado nos azulejos que cobrem esta magnífica fachada Gardoneh Mehr representa o infinito, o intemporal, o nascimento e a morte e pode ser encontrado em edifícios Iranianos desde 5000 ac.
Termino a visita à mesquita e deixo-me perder pelas ruas de Yazd. Não há melhor forma de conhecer esta cidade que a de nos deixarmos ir neste emaranhado de ruas e ruelas e surpreender com becos e recantos perdidos neste imenso labirinto.
Muito populares na cidade e um pouco por todo o país são as famosas torres de vento. Estas altas estruturas são semelhantes a chaminés e têm como função a de canalizarem o vento para o interior dos edifícios. Possuem normalmente quatro canais, que canalizam independentemente o vento das quatro direcções e funcionam assim qualquer que seja a direcção de onde sopra o vento. Normalmente são grandes e com amplos painéis de captação e até a mais pequena aragem consegue ser sentida no interior. Um método muito inteligente de criar um ar condicionado natural e que ajuda a suportar as altíssimas temperaturas que aqui se fazem sentir no verão.
São também muitos comuns as cisternas para armazenamento de água, que tiveram um papel muito importante na manutenção das cidades Iranianas ao longo de séculos. Com sistemas hidráulicos sofisticadíssimos, estas cisternas eram alimentadas com água captada nas montanhas, algumas a distâncias significativas da cidade, e permitiam armazenar água suficiente para os meses mais secos. Actualmente já não são usadas mas começasm a ser utilizadas para fins turísticos.
Na Praça Zaiee ficam dois dos edifícios históricos mais impressionantes da cidade. A prisão de Alexandre o Grande e o Túmulo dos 12 Imams. A prisão de Alexandre não funcionou na realidade como uma prisão mas sim como uma escola. Esta referência mal utilizada vem de um poema de Hafez que provavelmente não teria a melhor das opiniões sobre esta escola.
No túmulo dos 12 Imams, um edifício cúbico localizado logo a seguir à prisão, estão escritos os nomes dos 12 Imams Xiitas que em tempos estiveram aqui sepultados, mas que foram posteriormente retirados.
A cerca de 200m fica a interessante casa tradicional Kan-e Lari, com o seu lindíssimo páteo e uma estrutura muito bem cuidada.
Pela sua arquitectura e a sua estrutura em geral é recomendada a visita ao topo de um qualquer edifício de modo a obter uma excelente vista e perspectiva da cidade de Yazd. O meu objectivo era o de subir ao cimo do Hosseinieh, uma fachada monumental localizada junto de uma praça, mas que estava a ser difícil de encontrar. Depois de tanto procurar decido perguntar a um rapaz que passava de bicileta. O meu novo amigo, faz-me sinal para que o siga e leva-me ao local.
Contorno o monumento e procuro pelas escadas de acesso ao topo. Para minha desilusão estão fechadas e não é possível subir. Lembro-me então de ter passado por um café que tinha uma placa a indicar possuir um terraço com uma boa vista, não muito longe da praça Zaiee. Volto para trás e passado algum tempo consigo encontrar este simpático café. E com uma vista deslumbrante.
A noroeste do centro histórico ficam os famosos jardins persas Bagh-e Dolat Abad, património da Unesco e que se localizam junto a um pequeno palácio que outrora serviu de residência ao governador Karim Khan Zand. O local dista poucos quilómetros do local onde estou e decido ir a pé até lá. Sigo pelas ruas principais até chegar a uma grande avenida nas traseiras dos jardins. Não existe qualquer entrada e é então que percebo que esta fica do lado oposto e tenho de entrar de novo na zona residencial.
Vou seguindo por pequenas ruas e travessas no que me parece ser o contornar do grande complexo. Entro numa zona de casas e de ruas mais apertadas e sigo a tentar descortinar o caminho. Algumas não têm saída e sou forçado a voltar para trás e tentar por outras opções. Uma senhora que se prepara para entrar em casa repara em mim e percebe que sou um turista não muito confiante do caminho que está a tomar. Sabe para onde me dirijo pois não há mais nenhum monumento na zona e muito gentilmente tenta indicar-me o caminho. Aponta para uma rua e faz sinal que ao fundo é à direira. Agradeço e sigo a indicação. Ao chegar ao fim da rua hesito e olho para trás. A senhora faz-me sinal para virar... Sorrio e continuo.
Ainda não tinha andado 100m e começo a ouvir uns passos a correr atrás de mim. Viro-me e vejo uma menina a sorrir para mim e a dizer Dolat Abad? E faz-me sinal para a seguir. Pergunto-lhe se fala inglês e diz-me que não. A menina era a filha da senhora que estava a entrar em casa e que lhe disse para me vir ajudar.
Caminhamos mais alguns minutos por entre as casas e chegamos à entrada principal do complexo. A menina aponta como que dizendo que é aqui. Faço-lhe um sinal com o telemóvel a perguntar se podemos tirar uma fotografia. Ela aceita. Pergunto-lhe ainda como se chama, "es-me-toon chee-ye?" _ Sohrah, responde com um lindíssimo sorriso.
O complexo possui um bonito palácio ao centro, com uma grande torre de vento de cerca de 33m, vários vitrais e uma impressionante cúpula. Os jardins, estão dispostos ao longo de um grande corredor com um lago no centro, e possuem uma grande variedade de plantas, árvores e árvores de fruto nas zonas laterais.
Faço uma pequena pausa para descansar, para sentir mais aquele lugar tão especial e também para me dedicar um pouco à leitura. O dia foi bastante cansativo e o Bagh-e Dolat Abad é um bom local para recuperar energias. No regresso sou ainda desafiado para uma partida de Ping-Pong.
A viagem de Yazd para Xiraz demora entre 6 e 7h e decido apanhar o autocarro ainda pela manhã. Tomo o pequeno almoço com calma, faço o check-out, e apanho um táxi para me deixar no terminal de autocarros. Não preciso esperar muito e lá vou em mais uma viagem.
Xiraz
Considerada como o coração da cultura Persa há mais de 2000 anos, a cidade de Xiraz é ainda hoje uma das mais autênticas cidades Iranianas. Cidade de estudantes e poetas, chegou a ser uma referência durante o período medieval Islâmico e mais tarde, em 1747, chegou até a ser considerada capital do Irão.
A minha primeira impressão sobre a cidade recaíu precisamente na sua autenticidade e na sua identidade bem mais tradicional. As ruas, o comércio e o próprio estilo da cidade diferem um pouco do que já tinha visto até aqui.
Começo o meu primeiro dia com uma visita a Bagh-e Jahan Nama, um bonito e cuidado jardim de estilo persa e sigo logo a seguir para Aramgah-e Hafez, o túmulo do grande poeta Hafez. Hafez é uma espécie de herói entre os Iranianos e o seu túmulo atrai ainda hoje um grande número de peregrinos que aqui se deslocam para recitar poesia.
O seu túmulo em mármore possui um dos seus versos gravado e está centrado num belíssimo e charmoso jardim com dois grandes lagos na zona norte da cidade.
Descendo a Rua Hafez, encontramos a ponte da Porta de Esfan, uma antiga ponte em pedra sobre o rio Khoshk, seco nesta altura, e a seguir a Rua Bazar-e No, início da grande zona de bazaares de Xiraz.
Os vários bazaares datam de alturas diferentes, sendo o mais conhecido o Bazaar-e Vakil. Este bazaar alberga hoje mais de 200 pequenas lojas que vendem de tudo um pouco, como carpetes, artesanato, especiarias e roupa. A sua atmosfera é rica e vibrante e consegue alguma harmonia longe da confusão de outros mercados.
Através de uma pequena porta tenho acesso à Mesquita Vakil, perdida no meio do bazaar e que impressiona pelo seu imponente portal.
Atravesso o bazaar e saio na porta sul que dá acesso à grande Boulevard Lotf Ali Khan. Esta concorrida rua do centro da cidade leva-me até Bagh-e Naranjestan ou o jardim dos citrinos, que preenche o grande páteo do palácio da família de Mohammad Ali Khan, que o utilizou no séc XIX.
A sul da Boulevard fica o grandioso complexo Aramgah-e Shah-e Cherag, que nasceu da homenagem prestada a Sayyed Mir Ahmad, um dos 17 irmãos do Imam Reza que aqui foi morto. Um mausoléu foi aqui erguido em sua honra e mais tarde vários foram os edifícios adicionados ao complexo.
Ao entrar no complexo fui barrado por um dos guardas que me diz não poder entrar com a câmara fotográfica. Tento perguntar o que fazer e o guarda ao perceber que era estrangeiro diz-me para seguir e que estrangeiros podem utilizar as câmaras. Começo a fotografar o grande pátio central quando sou abordado por um senhor com uma faixa a dizer Ministério dos Negócios Estrangeiros e que me diz que não posso passar daquele ponto com a câmara. Digo-lhe que me deram autorização para entrar e fotografar mas ele insiste e diz que não posso passar daquele ponto a não ser acompanhado por ele. Tento dizer que só quero fotografar o exterior dos edifícios mas sem sucesso. Volta a insistir que com ele posso fazer tudo, e que sozinho não poderei entrar.
Fico com a impressão que ele quer vender os serviços de guia e discutimos um pouco. Digo-lhe que não me deixa alternativa, e no final confesso-lhe que não preciso de pagar um guia ao que ele me responde: _ Meu amigo, não é isso. Não precisas de me pagar nada, aqui dentro é tudo gratuito. Só tens de ir comigo!
E reforça: _ Comigo podes ver tudo e fotografar tudo! _ E lá fomos. Passados uns minutos pergunta-me se me pode juntar a um outro casal de turistas para a visita. Claro que não há problema e vamos todos com visita guiada.
O outro casal viajava com dois filhos adolescentes. Ele britânico, ela uma Iraniana que tinha abandonado o país há 22 anos e nunca mais tinha voltado. Os filhos mesmo sem nunca terem ido ao Irão falavam Farsi.
Entramos no santuário principal e vejo um dos mais impressionantes edifícios do país. Tectos e paredes forrados com pequenos azulejos espelhados, candeeiros ricamente ornamentados e um grande número de salas dedicadas à oração.
Percorremos os vários edifícios do complexo, todos eles ricamente decorados com azulejos em tons de azul. O guia vai-nos explicando as funções de cada um e a sua origem. Este é um dos locais mais impressionantes que visitei no Irão.
No final da visita pergunta-nos gentilemente se o podemos acompanhar a um novo serviço que tinham criado para turistas. Dizemos que sim e somos conduzidos para uma sala onde nos é servido chá acompanhado de umas bolachas. Juntam-se mais algumas pessoas pertencentes à organização e explicam-nos o propósito.
Mais uma vez o complexo e a vontade em mudar a imagem que o Irão tem no exterior. Começam por nos dizer que o Irão condena todo o tipo de atentados terroristas como os que aconteceram muito recentemente em Paris. Fazem questão de frizar que o Islão não é aquilo nem apoia atitudes daquele género. Distribuem-nos alguns panfletos e abrem a discussão para saberem a nossa opinião. Temos uma interessante discussão sobre o assunto e sobre o que poderá ser feito no futuro. No final agradecem-nos e ajudam-nos a sair do complexo. Por vezes fico com a impressão que o Irão, por ser tão fechado tem dificuldade em entender a realidade lá fora e em saber a melhor forma de agir. Sinto assim que também os ajudámos.
Bem no centro da cidade fica a fortaleza Arg-e Karim Khan construída em inícios do período Zand com o objectivo de mostrar alguma imponência à grande rival Esfahan. As suas muralhas estão elegantemente decoradas com tijolo e acabam em quatro imponentes torres circulares, uma em cada canto, com cerca de 14m.
Uma das torres apresenta uma grande inclinação dado ter sido construída sobre a cisterna que alimentava a zona dos banhos e esta estar a ceder. No interior, um grande páteo com citrinos e mais um grande lago.
Um dos meu objectivos do dia era também o de encontrar um motorista que me pudesse levar a Persépolis no dia seguinte, cerca de 60 Km a norte da cidade. Durante a visita a Arg-e Karim Khan conheço Yusuf, que depois de uma simpática conversa me pergunta se não preciso de um guia e motorista para ir a Persépolis. Digo-lhe que sim, que não preciso de guia, mas que o motorista será bem-vindo. Fala-me do preço e diz que faz um desconto então. Acertamos os detalhes, trocamos números de telefone e fica agendado.
O telefone toca já depois de jantar, atendo e era Yusuf. Vem com uma estranha conversa sobre o carro e sobre o facto de o termos de ir buscar a outro ponto da cidade. Não percebo bem a ideia, mas digo que está bem e que não há problema.
Acordo com um lindo dia de sol, a contrastar com o dia anterior que tinha sido mais chuvoso. Perfeito para conhecer Persépolis. Tomo o pequeno almoço com calma e vejo Yusuf chegar à entrada do hotel tal como combinado.
Cumprimento Yusuf e saímos do parque do hotel. Yusuf pede desculpa e diz que temos de ir buscar o carro. Vamos conversando rua abaixo e pergunto se é longe. Diz-me que temos de apanhar um taxi para ir até ao carro mas que será rápido. É então que começa com uma conversa um pouco estranha. Diz-me que será meu guia e que não me poderei distrair com outras pessoas por lá. Reforço que não pedi guia, só um motorista, ao que ele assente, mas que ainda assim insiste em ir comigo. Cerca de 500 m mais abaixo pára um táxi e começa a falar com o taxista. Vejo-o puxar de uma tabela e consigo entender que estão a negociar o preço para irmos para Persépolis. Confronto-o com esse facto quando estamos a entrar no taxi e ele faz-se desentendido. Insisto em saber qual é mesmo o objectivo de depois de uma acesa discussão percebo que na realidade Yusuf apenas criou um esquema para ir comigo a Persépolis, de taxi e tentar cobrar serviços de guia. Peço ao taxista para parar e saio e digo a Yusuf que não foi nada daquilo que tínhamos combinado. Queria um motorista para me levar e só isso, e para apanhar um taxi não preciso de ajuda.
Yusuf segue-me por algum tempo a tentar explicar-se e mostrar que compreendi mal. Digo-lhe para se ir embora e agradeço ter estragado a minha manhã. Volto ao hotel e peço um taxi na recepção. Pago quase o mesmo...
A viagem dura quase 1h até Persépolis. O taxista deixa-me na entrada e diz-me que espera no parque anexo. Tiro todo o equipamento e dirijo-me à bilheteira.
A magnífica Persépolis era a antiga capital do Império Aqueménida, e foi declarada como Património da Humanidade pela UNESCO em 1979. A partir de 522 ac e durante um largo período dominou toda a região do Médio Oriente. Alexandre, o Grande chegou a permancecer aqui algum tempo aquando da sua invasão ao Império Aqueménida.
Ainda são visíveis sinais do incêndio que aconteceu no palácio oriental de Xerxes e que se alastrou por toda a cidade, causando a sua destruição parcial.
É um dos lugares arqueológicos mais importantes do mundo tanto pelas suas impressionantes ruínas como pela enorme variedade de artefactos aqui encontrados.
É incrível também o facto de um lugar desta natureza e com esta riqueza não ter quase turistas e ser possível visitar de forma bastante tranquila. Em qualquer outro lugar do mundo, um sítio histórico deste género estaria apinhado de gente com máquinas a tiracolo e em grande algazarra. Aqui, paz e tranquilidade, que é o principal para se poder disfrutar de um local com esta grandeza.
Começo pela imponente Porta de Xerxes e o seu grande arco que ainda hoje impressiona os visitantes à sua chegada.
Sigo, através do Palácio Apadana até ao Palácio das 100 Colunas. Volto a Apadana e ao seu grandioso hall central onde ainda estão de pé algumas das suas majestosas colunas.
Subo as escadas do Astana e delicio-me com os magníficos painés e com o seu conteúdo. Estão aqui registos históricos impressionantes e retratados alguns dos momentos mais marcadas da história da humanidade.
Contorno o Hadish, um dos mais bem conservados e sigo para este, para as colinas onde foram cravados na rocha os dois ostentosos túmulos de Artaxerxes II e Artaxerxes III.
Junto a Persépolis estão mais dois lugares de bastante importância arqueológica. O primeiro, Naqsh-e Rajab, possui algumas cenas das conquistas imperiais e de algumas cerimónias perfeitamente imortalizadas em vários painéis nas rochas. Depois de Persépolis a sua imponência é menor, mas não deixam de valer uma pequena visita.
Poucos quilómetros mais à frente está Naqsh-e Rostam, um grande penhasco que alberga os túmulos de Darius II, Artaxerxes I, Darius I e Xerxes I. Nele estão também gravados episódios das conquistas e cerimónias reais.
Apesar de menos conhecido não deixa de ser um lugar grandioso. A dimensão dos túmulos é impressionante e a forma como foram construídos também.
Em Naqsh-e Rostam termina a visita a Shiraz. O regresso a Teerão é feito por avião e demora pouco mais de uma hora. Sobram uns dias para descansar desta aventura que foi das mais marcantes da minha vida. Apesar das altas espectativas que trazia o Irão não desiludiu e ganhou um lugar de destaque nas minhas preferências.
A diversidade das paisagens, a sua beleza, a cultura, o deserto, a gastronomia e acima de tudo as pessoas, fazem do Irão um destino obrigatório. Aqui passei alguns dos momentos mais especiais da minha existência e aqui fui tratado e acarinhado como em nenhum outro lugar do mundo. É um país muito grande e ainda ficou muito para ver. Quero muito voltar e na hora da despedida fica um emocionado: _ Até já Irão!
Inglaterra 2 - Londres
The pain that you create now is always some form of
nonacceptance, some form of unconscious resistance
to what is. On the level of thought, the resistance
is some form of judgment. On the emotional level,
it is some form of negativity. The intensity of the
pain depends on the degree of resistance to the
present moment, and this in turn depends on how
strongly you are identified with your mind.
Eckhart Tolle
Cerca de duas horas separam a capital Bruxelas de Londres através do comboio de alta velocidade Eurostar. Uma viagem que ambicionava há muito fazer quer pela curiosidade de viajar no comboio mais rápido da Europa quer pela passagem pelo Canal da Mancha através do Eurotunel. Foi uma boa experiência, com uma boa noção da velocidade fora dos centros urbanos, ainda que, não tenha comparação com o Maglev de Xangai. Os comboios também já são um pouco antigos e em termos de facilidades para os passageiros deixam um pouco a desejar em comparação com serviços equivalentes noutros pontos.
Uma das grandes vantagens do uso dos comboios é o facto de as estações estarem normalmente localizadas no centro das cidades. O Eurostar deixa-nos precisamente no centro de Londres em St Pancras, dando-nos uma muito maior facilidade em termos de acessos.
Estas é a segunda vez que visito Londres depois de uma visita relâmpago em 2008 durante a escala na viagem para Calcutá. Pela curta duração não foi possível na altura sentir muito da cidade entre a correria para ver os principais monumentos. Gostei mas na realidade foi uma cidade que não me preencheu nem me levou a sentir grande empatia. Claro está, foi muito pouco tempo para absorver, e pode ser que desta vez consiga inverter esta minha opinião.
O primeiro passeio começa na estação de metro de Tower Hill e na Tower of London, uma fortificação construída em 1078 por Guilherme o Conquistador na altura nas portas da cidade e que desde então tem tido as mais variadas finalidades.
Mesmo ao lado fica um dos ícones da cidade de Londres a Tower Bridge, a famosa ponte-báscula construída sobre o rio Tamisa e que é hoje um dos principais destinos turísticos. É interessante atravessá-la a pé não só para admirar a sua arquitectura como pelas excelentes vistas sobre o rio e grande parte da cidade.
Já na margem sul do rio Tamisa, numa das novas e reconvertidas zonas da cidade fica o City Hall e um conjunto de modernos edifícios que albergam comercio, serviços e escolas.
Aqui começa também Queens Walk, um passeio ribeirinho que acompanha o rio ao longo de todo o centro da cidade de Londres. O passeio é interessante, com boas vistas cobre a cidade e sempre na proximidade da água. Decidi fazer este passeio até à London Bridge, onde atravessei de novo para a margem norte.
Entrando pela Cannon Street é possível visitar um número significativo de monumentos, como a St Paul's Cathedral, St Dunstan, St Clement Danes e o The Royal Courts of Justice.
Cannon Street liga a Ludgate Hill que liga à Fleet Street, numa sucessão de ruas concorridas e estreitas. Em plena hora de almoço com todo aquele tráfego de pessoas, autocarros e todo o tipo de carros tenho uma sensação algo clautrofóbica. Londres é mesmo uma cidade de enchentes e confusão o que, combinado com este estilo de cidade de ruas estreitas e sinuosas em algumas zonas pode ser algo atrofiante.
Depois de vários kms de caminhada chego a Covent Garden e ao seu renovado mercado. Actualmente o espaço é muito mais do que um mercado com inúmeras soluções de restauração, galerias, espaçoes comerciais e muita performance de rua.
Mesmo em frente do mercado fica a St Paul's Church com um pequeno e agradável jardim muito utilizado para as pausas de almoço.
De Covent Garden tempo ainda para visitar Picadilly Circus, o Soho, Carnaby e Oxford Street.
Localizado no centro-norte de Londres fica Camden Town, um antigo distrito industrial e fortemento ligado à ferrovia que hoje está convertido ao retalho, entretenimento e à cultura alternativa. Camden possui uma série de mercados de renome internacional onde se pode encontrar de tudo e com uma grande componente multi-cultural.
Num dia bem mais nublado regresso a Westminster, local onde já havia passado mas que é um bom ponto de partida para uma visita a esta zona da cidade com mais algum detalhe. O metro deixa-nos mesmo em frente ao Big Ben. Mais uns passos e estamos perante o imponente Palácio de Westminster.
Toda a área é bastante interessante e uma volta pelo quarteirão até chegar a Westminster Abbey e Central Hall revela algumas boas surpresas.
Não muito longe, e perto do HM Revenue & Customs começa St James Park, um dos mais emblemáticos parques de Londres que nos leva até Buckingham.
O Palácio de Buckingham é a residência oficial e principal centro da realeza do Reino Unido em Londres. Foi em tempos conhecido como Casa Buckingham, o edifício construído em 1703 para John Sheffield, 1.º Duque de Buckingham e Normanb.
Em frente aos portões do palácio fica o memorial de Vitória, criado pelo escultor sir Thomas Brock, em 1911.
O último dia em Londres é passado no charmoso e típico bairo de Notting Hill. O bairro, muito ao estilo vitoriano, destaca-se pela sua singularidade, pela sua cor, harmonia e vivência. Decidi visitá-lo precisamente neste dia, sábado, também por causa da sua conhecida feira de antiguidades, artesanato e de alimentação. No entanto, o elevado número de pessoas que visitam a feira acaba por criar algum caos na principal rua do bairro e estragar um pouco a magia.
Ainda assim, e desviando um pouco das ruas mais movimentadas, gostei imenso do bairro, das suas pequenas lojas, dos pequenos bares e restaurantes e das suas esplanadas. Um lugar bastante simpático e acolhedor e que nos consegue transmitir algo. Fico com a sensação que se tivesse de viver em Londres era aqui que gostava de ficar...
No geral, gostei bastante mais de Londres nesta visita, mas continuo ainda a achar que a cidade não consegue ter uma alma própria, algo que lhe dê uma identidade, que a distinga. Esta é uma das capitais do mundo e por essa razão sofre alguma descaracterização. Já não se parece com Inglaterra, não vai buscar nada à identidade do país nem à cultura. É uma manta de retalhos, de nacionalidades e culturas, de tudo e mais alguma coisa, numa mistura que no fim não se assemelha a nada. Toda esta vantagem da multiculturalidade foi feita destruíndo as raízes históricas de Londres. Muitas das cidades europeias são multiculturais, mas conseguem ainda assim manter a sua identidade. Paris é Paris e é França, Berlim continua a ser uma cidade Alemã, Amesterdão também mantém a sua cultura. Aqui há de tudo e comercio dos quatro cantos do mundo, mas que absorveu na sua quase totalidade todos os estabelecimentos britânicos. Uma vantagem em detrimento de outras...
Não deixa ainda assim de ser uma cidade com uma boa vivência e interessante, e onde é muito fácil adaptarmo-nos. Mas sempre com uma sensação de que falta algo...
Alemanha 9 - Colónia
A vida é agora. Nunca houve um momento em que a sua vida não fosse agora...
Nem nunca haverá...
Eckhart Tolle
_ Pai, tu gostas mesmo da Alemanha não é? _ A pergunta surgiu assim que saímos do comboio e entrámos na grande Köln Hauptbahnhof, a principal estação de comboios da cidade de Colónia na Alemanha.
Menos de duas horas separam Bruxelas de Colónia através do comboio pendular ICE da Deutsche Bahn. Um comboio moderno, confortável e onde tivémos até direito a um camarote bem mais sossegado e partilhado apenas com uns viajantes mexicanos.
Durante a viagem, alguma conversa e alguma partilha da experiência adquirida anteriormente na Alemanha. Mesmo sem querer o meu tom altera-se quando falo do gigante europeu, das suas cidades, das suas gentes e da sua "vida". Guardo recordações muito boas dos longos meses que vivi em Leipzig e este é sem dúvida um dos países que mais tem a ver comigo.
_ Sim, adoro a Alemanha. É notório, não é?
Assim que saímos da estação de comboios damos logo de caras com a imponente Kölner Dom, a impressionante Catedral de Colónia. Trata-se da estrutura gótica mais famosa da Alemanha e cuja complexa construção se estendeu desde 1248 até ao séc XIX.
É de facto uma obra que impressiona quer pela sua dimensão, quer pela arquitectura bastante rica. A altíssima nave central dá acesso aos interessantes cadeirais góticos, ao relicário e altar dos reis magos.
Em termos de monumentos a cidade não tem muito mais oferta, com excepção para a basílica de St Andreas e algumas igrejas. No entanto o centro histórico da cidade é bastante interessante, com um sem número de locais emblemáticos e bastante típicos.
Começando pela simpática praça de Heumarkt, temos acesso às estreitas e sinuosas ruas da cidade antiga até chegar à zona ribeirinha e uma das zonas mais típicas, o Fischmarkt.
Fischmarkt é uma das zonas mais bonitas e típicas da cidade e também uma zona boémia. Repleta de esplanadas e de vida, a zona ribeirinha de Colónia fervilha a qualquer hora do dia.
Toda a área é como que protegida pela Groß St. Martin Kirche que se ergue de forma altiva no coração do bairro.
O resto do tempo, até ao comboio de regresso, foi passado em passeio um pouco por toda a cidade, e a absorver muito da sua energia muito própria. Colónia é uma cidade muito viva mas ao mesmo tempo muito tranquila e descontraída. Uma cidade completa que oferece uma grande qualidade de vida aos seus habitantes.
Bélgica 5 - Namur
Não devemos permitir que alguém saia da nossa presença sem se sentir melhor e mais feliz.
Madre Teresa de Calcutá
Namur, cidade do sul da Bélgica é conhecida pela sua cidadela, localizada no topo de uma colina e na confluência dos rios Sambre e Meuse. A cidadela, de origem romana, foi sendo adaptada ao longo dos tempos, tendo a sua ultima intervenção sido feita entre 1631 e 1675 quando a cidade estava sob domínio holandês.
Posteriormente funcionou como um posto militar, função essa que foi abandonada em 1891 e de seguida foi criado um novo anel de fortificações para que pudesse ser feita uma melhor defesa da cidade, isto até cerca de 1930.
A subida, feita através de íngremes e sinuosas escadarias, é sempre acompanhada de uma fantástica vista sobre a cidade e os rios. Dentro do complexo é possível a visita a vários dos edifícios que a compões e também a muitos dos túneis usados como escapatórias nos tempos das invasões.
De volta à cidade, é recomendada a visita à catedral de St Auban, que se ergue imponente sobre o restante casario, e um passeio pela Place d'Armes, Rue de l'Ange, Igreja Saint Loup e Place du Théâtre.
Bélgica 4 - Antuérpia
O sofrimento é um estado de inconsciência.
Sofremos porque não estamos conscientes do que fazemos,
do que pensamos, do que sentimos...
Por isso, estamo-nos a contradizer o tempo todo.
- Osho
Utilizando de novo a localização central de Bruxelas, foi possível de assim visitar a mais uma importante cidade belga, Antuérpia.
Antuérpia é a segunda maior cidade do país, está localizada na Flandres e possui um dos mais movimentados portos da Europa. Começou a ganhar destaque devido ao seu porto, ainda no séc II, mas voltaria a afirmar-se pouco depois como um importante e próspero centro industrial da Europa.
A viagem, desde Bruxelas é feita de comboio e a chegada não poderia ser mais impressionante. A estação Antwerpen Centraal, construída entre 1895 e 1905, é hoje um dos ícones da arquitectura belga e uma das mais bonitas.
Em 1998 sofreu obras de ampliação e reconversão de forma a deixar de ser apenas uma estação terminal para ser uma estação de passagem. Largos túneis foram escavados e os cais distribuídos por vários pisos, o que a tornam actualmente numa grande obra de engenharia.
Junto à estação começa a grande rua central De Keyserlei. Uma grande rua de comércio e grandes armazéns e início do centro histórico. Nas traseiras, fica a Vestingstraat, uma rua conhecida pelo comércio de diamantes e cuja prosperidade atraíu inúmeros judeus, muitos deles refugiados no séc XVI. O facto de a cidade ser considerada o centro mundial do diamante deve-se a que em Antuérpia estima-se que são negociados 80% dos diamantes brutos e 50% dos diamantes lapidados de todo mundo.
Contrariando a noção pré-concebida que tinha por se tratar de uma cidade industrial, Antuérpia revela-se uma excelente surpresa, com uma grande riqueza arquitectónica e cultural. Uma cidade bastante simpática e cheia de vida.
O passeio segue-se pela Leystraat e pela rua Meir até ao centro, onde estão localizados os edifícios e praças mais emblemáticos da cidade.
Junto à Groenplaats, a agradável e simpática Praça Verde, fica a Onze Lieve Vrouwe Kathedraal, a imponente Catedral de Antuérpia começada a construír em 1353 e acabada 200 anos depois. É a maior catedral gótica do país e ocupa cerca de 1ha de área.
Sensivelmente ao virar da esquina fica a Grote Markt, o centro de comércio da cidade no séc XVI e onde se localiza também a Câmara Municipal. Uma lindíssima e grandiosa praça ladeada de edifícios de grande valor arquitectónico.
A zona ribeirinha possui uma passagem elevada de onde é possível disfrutar da proximidade do rio Scheldt e das bonitas vistas daí resultantes. Local ideial para aproveitar o bom tempo com que fomos brindados!
Tailândia 7 - P'lo País dos Sorrisos
"O importante não é o que se dá, mas o amor com que se dá."
Madre Teresa de Calcutá
Tailândia, grande símbolo da amabilidade, país de sorrisos e diversão, exotismo e cultura. Dos coloridos templos às praias douradas, da densa floresta tropical à energética Banguecoque, aqui tudo é vibrante, tocante e penetrante.
Precisamente 12 anos depois da minha primeira experiência neste país que tanto me marcou e mudou, aqui estou eu de novo para mais e enriquecedoras vivências, para absorver mais e mais desta energia única e para explorar mais deste paraíso asiático e acima de tudo de mim mesmo...
Tudo começa em Banguecoque, essa grande metrópole que nunca pára, nunca dorme nem tão pouco abranda. Um barco apertado serve de transporte de Saphan Taksin até Tha Tien, acesso aos imponentes Grand Palace e Wat Phra Kaew.
É quanto a mim uma das maiores experiências da cidade, tanto pelas suas vistas e diferentes perspectivas que temos da cidade como pelo incrível frenesim que se vive sobre as águas do Mae Nam Chao Phraya. Foi um dos locais que mais me marcou na minha primeira passagem por Banguecoque e mais uma vez me fez voltar a vibrar.
Nas margens do rio amontoam-se todo o tipo de edifícios, monumentos e templos, como Wat Arun, mercados e cais de acesso às centenas de embarcações que por aqui serpenteiam.
Os acessos ao cais são normalmente utilizados também para venda ambulante e na grande maioria das vezes rodeados de típicos e coloridos mercados, que nesta zona da cidade privilegiam a venda de peixe fresco ou seco.
Wat Phra Kaew é um enorme complexo de templos Budistas que alberga também a antiga residência da monarquia tailandesa, o Grand Palace e que se tornou na maior e mais importante das atracções turísticas da cidade. Infelizmente, num país tão turístico como este isso pode transformar-se em algo menos agradável que leva a um grande acumular de filas e enormes aglomerados de pessoas um pouco por todo o lado, e acima de tudo, o ruído que não nos deixa absorver devidamente este local tão especial. A saturação atinge-nos antes de tempo e não demora até que queiramos abandonar o local.
Não muito longe fica o mais pequeno mas não menos interessante Wat Pho, conhecido por albergar o maior Buda deitado e a maior colecção de imagens de Buda do país. Pelo facto de não ter tantos turistas é-nos permitido disfrutar e apreciar mais este local sagrado.
Bem mais típico, confuso e apertado é o China Tow, um dos bairros mais conhecidos da cidade. Trata-se de um grande centro de comércio onde se pode encontrar de tudo em longos e apertados mercados de rua. É também o local ideal para apreciadores da comida chinesa com uma grande variedade de restaurantes do género.
Um pouco mais a norte encontra-se um dos meus templos preferidos, o Golden Mount, no topo da que me parece ser a única colina de Banguecoque. Local de culto, de uma energia única e que ainda tem a vantagem de oferecer uma vista soberba sobre a cidade.
A subida pode ser difícil mas a recompensa é grande. Ao longo de todo o trajecto somos brindados com várias alusões a figuras míticas do Budismo.
Terminadas as visitas aos ponto mais importantes, há que reservar algum tempo para o melhor de Banquecoque, que não se vê, não se fotografa mas que se sente, ouve e cheira. É preciso tempo para nos perdermos nas ruas, nas multidões e na confusão da cidade. É preciso tempo para pormos todos os sentidos a funcionar e para absorver o que de melhor nos é proporcionado. Não é fácil lá chegar, mas mais tarde ou mais cedo vamos acabar por nos apaixonar por ela...
Ayuthaya
Começa cedo este longo dia de viagem e visita a Ayuthaya, e cujos planos incluem seguir depois pelo comboio nocturno para Chiang Mai. Malas feitas, checkout, e partida rumo à estação central de Hua Lamphong.
Ao chegar ao metro logo na entrada sou abordado pelo segurança que me faz passar a minha enorme mala pelo detector de metais. Soa o alarme, como não, e pergunto se quer que abra a mala ao que ele me responde com nova pergunta do género: _ "Do you have Tinti insai?" _ Não percebo e pergunto o que quer dizer com ar admirado ao que ele com um ar sorridente responde: _ "Tinti... Bomb..." _ Desta vez percebo, "TNT inside", e entendo a brincadeira. Respondo que não também com um sorriso ao que ele me brinda com um muito simpático, "pode seguir"!
A viagem de metro não é longa e esta é de facto a melhor forma de viajar em Bangkok quando temos de respeitar horários. De carro duraria com certeza muito mais de 1h, de metro ficou-se pelos 20 minutos.
Hua Lamphong é a principal estação de comboios de Banguecoque e ponto de partida de uma infinidade de turistas que pretendem visitar o centro e norte do país. Um edifício antigo com uma grande nave central e onde se vive a agitação própria deste tipo de gares. Pessoas que correm entre bilheteiras e comboios ou à procura de informação, vendedores que tentam estar em 5 lugares ao mesmo tempo, famílias que se tentam organizar e a azáfama de quem por aqui trabalha num dos muitos estabelecimentos comerciais que servem de apoio.
É cedo e ainda há tempo para o pequeno almoço. Opto por um Donut e um Capuccino, vejo a conta e sorrio. A viagem para Ayuthaya de cerca de 3 horas custa 15 Baths, cerca 35 cêntimos de Euro, o Donut custa 30 Bahts, o dobro...
Chegada a hora, começa viagem...
Ou talvez não, pois no país do "nunca se sabe" os imprevistos são sempre algo que tem de estar sempre presente. E desta vez não foi diferente.
Chega a hora da partida e o modesto comboio, já cheio de locais e turistas não se mexe. Entram e saem vendedores e nem sinal da partida. O tempo passa e a impaciência começa a tomar conta de alguns dos que aqui estão, enquanto outros parecem já estar habituados. Passam 15 minutos, 30, 40... Passa 1 hora e nem sinal... Até que um solavanco interrompe aquela algazarra e nos dá algum alento... Está quase, pensamos... Mas não! O comboio pára, solavanco para trás, solavanco para a frente, outro e outro e mais uma espera. Até que finalmente começa a andar... No sentido certo e lá vamos nós...
Ainda assim, os atrasos não se ficaram por aí. Passados alguns minutos a composição volta a parar por algum tempo. Retoma a viagem e mais uma paragem, e outra e outra. As espera são longas e tento perceber a razão. Uma coincidência, em cada uma das paragens atravessamos depois uma passagem de nível e começo a pensar que ao invés de ser o transito automóvel a parar para deixar o comboio passar é o contrário. Tento não acreditar mas é uma teoria que faz cada vez mais sentido e que me parece ser verdadeira. Atraso atrás de atraso lá vamos indo, e algumas horas depois do previsto chegamos ao nosso destino.
Primeiro passo, deixar as malas em local seguro na estação e adquirir de imediato o bilhete para o comboio da noite para Chiang Mai. O dia estaria então livre para visitar a cidade e no final seria retomada a viagem.
_ "Está cheio!", responde o senhor da bilheteira. Fico assustado, não há lugar para continuar viagem nessa noite. Tento vários horários, várias classes e nada. Há um evento em breve e todos os Tailandeses vão visitar as famílias nesta altura. Vagas creio que só no dia seguinte e no comboio diário, algo que não interessa pois além de ser necessário pernoitar em Ayuthaya, era menos um dia inteiro que poderia ser aproveitado em Chiang Mai.
Pergunto pelos autocarros e é-me indicado que a estação fica um pouco longe, fora da cidade, mas esta é a única esperança. Negoceio um tuk-tuk e pomo-nos a caminho... A estação de autocarros não é mais que um pequeno e modesto edifício com uma bilheteira e uma sala de espera assistida por um pequeno café. Vêem-se bastantes turistas à espera, o que compreendo dada a falta de comboios. Corro para a bilheteira e pergunto pelos autocarros e tempo de duração. _ "Quero um daqueles bons com AC, ok?", pergunto. Confirmam-me que sim, com partidas à noite e uma duração de 9h. Sem outra solução, há que aceitar.
Ayuthaya foi em tempos uma grande e próspera cidade com um importante papel na Ásia. Chegou a ser capital de Sião entre 1350 e 1767 e um importante porto de comercio que lhe concedeu grande riqueza e imponência. Hoje é possível ver o que resta do património desse tempo, muito dele em ruínas, mas que nos dá uma ideia do que foi a cidade durante o seu auge.
Wat Phra Si Sanphet era o maior tempo da cidade e hoje um dos símbolos de Ayuthaya com as suas 3 chedi, ou torres sagradas. Foi usado por vários reis ao longo de séculos e na altura possuía um gigantesco Buddha de 16m de altura coberto com cerca de 250Kg de ouro que foi mais tarde derretido e saqueado pelos Birmaneses.
Mesmo ao lado o santuário de Wihaan Mongkhon Bophit, uma estrutura bastante mais recente que alberga um dos maiores Budas da Tailândia.
No extremo sul do complexo fica um interessante mercado todo ele vocacionado para os visitantes, com uma infinidade de doces típicos da região e iguarias locais. Um bom local para uma pausa para o almoço.
A cerca de 1Km de distância fica Wat Phra Mahathat, um grande complexo construído em 1374 e que é talvez um dos mais fotografados graças à misteriosa figura de Buddha que surgiu no meio das raízes de uma grande árvore.
As ruínas mostram o que foi em tempos um grandioso templo e um pouco à semelhança do que se pode observar nas ruínas da cidade percebe-se que na altura, em Ayuthaya, existiam bons arquitectos mas não tão bons engenheiros...
A este da cidade fica o impressionante Wat Chai Wattanaram, contruído em 1630 pelo Rei Prasat Thong. Famoso pelas bonitas imagens que proporciona e pelo contraste com a paisagem em volta.
Finda a visita a Ayuthaya é tempo de recuperar as malas e preparar a viagem rumo ao próximo destino. Isto não sem antes me despedir do meu novo "amigo", motorista de tuk-tuk e companhia nas visitas na cidade.
À noite a "pseudo-estação" de autocarros estava apinhada. São muitos os autocarros que por aqui passam com os mais variados destinos e sendo este um país turístico por natureza, há sempre um elevado número de turistas em trânsito.
Confesso que estava um pouco receoso quanto ao autocarro. Uma viagem de 9h não é propriamente fácil e sem conforto pode ser um martírio. A senhora da bilheteira tínha-me indicado o melhor autocarro, que consideram VIP, mas mesmo assim haviam ainda algumas dúvidas.
Passam vários autocarros e parecem-me bastante confortáveis. Um deles segue para Chiang Mai e vou confirmar se não é o meu. _ "Não, este é o regular, tens de esperar pelo VIP"_ dizem. Bom, assumindo que o VIP é melhor... Começo a ficar mais descansado...
E revelou-se uma grande surpresa. Na verdade o VIP Bus como lhe chamam, é o melhor autocarro onde já andei. Os bancos largos e espaçosos, grande distância com os bancos da frente e fáceis de reclinar até fazerem quase uma cama. Foi-nos servida uma refeição ligeira e distribuídos cobertores para a noite. A viagem, sempre feita em auto-estrada foi segura e tranquila o que tornou as 9h bem mais fáceis de suportar. Há males que vêm por bem e na realidade esta foi uma muito melhor opção que o comboio...
6h30 da manhã e chegamos a Chiang Mai!
Chiang Mai
Segunda cidade da Tailândia e a grande capital do norte do país, Chiang Mai é em tudo diferente de Banguecoque. Bastante mais descontraída e tranquila, esta é uma cidade de encantos com uma cultura bastante mais alternativa. A cidade vai-se renovando em torno de um charme muito próprio e de uma identidade forte o que a torna num destido bastante apetecível. O turismo aqui tem uma forte presença mas não é só pelo grande número de monumentos da cidade. Há todo um espírito e uma maneira de estar que traz as pessoas aqui. A energia, a natureza e o contacto próximo com o natural e o bem-estar. Chiang Mai é especial e foi uma das minhas grandes surpresas.
O centro da cidade está rodeado de um pequeno canal, outrora usado como defesa e que agora delimita a parte histórica, denominada Cidade Velha, da restante. É aqui que estão concentrados praticamente todos os monumentos e locais de interesse e dada a sua pequena dimensão pode, e deve ser percorrida a pé. Há muito para sentir aqui e tudo deve ser apreciado com a devida calma.
Wat Phra Singh é o maior dos templos e o mais visitado e alberga uma das mais veneradas figuras de Buddha. Bem perto ficam os não menos interessantes Wat Chedi Luang e Wat Phan Tao.
Um pouco por todo o lado encontram-se espaços de devoção e reflexão, monges, e locais de culto. Tudo tratado com o devido respeito e consideração.
O norte da Tailândia é conhecido por albergar vários tipos de tribos nas suas montanhas. A mais conhecida é talvez a Long Neck Tribe ou Tribo dos Percoços Compridos. Mas existem outras, todas elas com as suas peculiaridades.
Grande parte das tribos são oriundas da Birmânia e refugiaram-se em locais remotos da densa floresta tropical que cobre as montanhas da região. Além de sustento a floresta conseguiu dar-lhes sempre protecção e mantê-los afastados da curiosidade alheia.
Infelizmente com a massificação do turismo e a notoriedade que estas tribos passaram a gozar, deixou de ser possível conviver com elas no seu meio natural e hoje, qualquer das visitas sente-se como que artificial. As tribos vivem numa espécie de "campus" para turista ver e não é possível observar o seu verdadeiro dia-a-dia. Algo que poderá ser compreensível dado o elevado número de turistas que as visitam e também o facto de as autoridades as quererem proteger.
O grande meio de tranporte da região foi em tempos o elefante, animal de grande porte que durante séculos foi uma ajuda preciosa. Actualmente e na grande maioria dos casos, servem para passeios turísticos pela floresta e margens dos muitos rios que aqui existem.
Ponto alto da visita a Mae Taeng foi a caminhada pela floresta até à cascata de Kuet Chang. Um trilho bastante difícil em terreno acidentado e cujas condições foram ainda severamente afectadas pelas intensas chuvas da época. No entanto, a recompensa é enorme e no final, além da beleza do local, temos a oportunidade de nos refrescar nas agitadas águas da cascata.
Várias horas de caminhada seguidas de rafting e bamboo rafting na descida do rio.
O ultimo dia de Chiang Mai foi dedicado à descoberta da zona Este da cidade e ao mercado de Talat Tonlamyai. Este interessante mercado está dividido e várias secções desde frutas ao peixe seco, passando pela carne, aves e até flores.
Tempo ainda para visitar um antigo complexo de templos às portas da cidade, a sul, e cujas ruínas se encontram espalhadas por vários Kms. A zona é muito pouco turística e como tal encontra-se algo abandonada sob o ponto de vista de apoio e informação turística. Um guia oferece os seus serviços a bordo de uma pequena "charrete", mas o o dia ainda é uma criança e a zona é excelente para ser explorada a pé...
Ko Samui
Dada a distância e o facto de Samui ser uma ilha, a viagem entre Chiang Mai e Ko Samui foi feita de avião. Mais uma vez o facto de esta ser uma altura complicada para viagens internas revelou-se um grande obstáculo e à falta de lugares nos vôos directos houve necessidade de uma pequena paragem em Banguecoque.
À falta de lugares no vôo directo seguiu-se a falta de reserva no hotel, em Samui. Primeiro pedem que espere um pouco, mais uma espera e a justificação que estão a terminar o quarto. Acho estranho e pela minha experiência sei que a reserva não foi feita. Na Ásia a probabilidade deste tipo de coisas falharem é elevada e está claro que é mais um caso.
A reserva, feita dias antes estava perdida e só a muito custo foi encontrada algures numa pilha sobre a secretária de alguém. Mais tarde admitem o erro e são forçados a um upgrade pela falta de quartos semelhantes...
Samui mudou bastante desde a última visita em 2001. Esta ilha paradisíaca tornou-se num dos principais destinos de turismo e com isso perdeu muito do seu encanto e pacatez. Chaweng, a parte mais turística, é hoje um amontoado de resorts, restaurantes, bares, discotecas e gente. Muita, muita gente que aqui vem em busca de praia, diversão e agitação e que, como tudo o que é demais, retira muito do encanto natural da ilha.
O Big Buddha é um dos grandes exemplos. Recordo sempre, de forma muito intensa a minha primeira passagem por este local, na altura de culto e onde se faziam oferendas ao som de um Mantra que me tem acompanhado até aos dias de hoje. Sentia-se uma energia muito forte no ar e ninguém saía daqui indiferente.
Hoje, passados 12 anos, é mais um ponto turístico no mapa, repleto de pessoas e bancas de venda de artigos totalmente dedicados aos turistas. Foi-se o Mantra, foram-se as oferendas e o culto, foi-se a energia...
No entanto a ilha é ainda bastante interessante e é possível encontrar locais de grande beleza. Um deles, a cascata de Nam Tok a sul.
A este de Samui fica o magnífico parque nacional Ang Thong, um enorme aglomerado de pequenas ilhas cobertas por densa e verdejante floresta tropical e que aqui e ali criam algumas baías com pequenas e paradisíacas praias.
A viagem, feita numa embarcação com várias dezenas de pessoas dura cerca de 1h30 e é depois desdobrada em algumas das mais interessantes ilhas. Destaque para o Emerald Sea, um "mar" interior de um verde intenso numa pequena ilha, e para o miradouro de Ko Wa Ta Lap de onde se consegue uma vista lindíssima de uma grande parte do Parque Natural.
No regresso da viagem, já no transfer do barco para o hotel, numa típica van de 9 lugares, somos interrompidos por um estranho ruído nas traseiras. No último lugar, julgo tratar-se de algo que caíu na mala atrás, dado o barulho algo metálico. No entanto começo a ouvir o som exterior mais forte e viro-me para ver... Qual não é o espanto quando reparo que o vidro traseiro da van caíu e encontra-se suspenso e preso apenas por um dos cantos. Olho para o motorista que age como se nada fosse e é então que o decido avisar. Este ri-se, pára, e sai para ver o que se passa... Arranca o vidro, mete-o dentro do carro e segue viagem... Thai style...
O adeus a Samui foi feito a partir do mar a bordo do grande ferry que liga Samui a Don Sak. A viagem para Khao Lak, o nosso próximo destino na costa oposta, a norte de Phuket, ainda não estava definida. Para já Don Sak, depois Surat Thani, depois... Logo se vê... Comboio não há e ao que parece autocarros a esta hora do dia também não. A ideia é confirmar na estação de autocarros e em último caso optar pelo transporte particular.
A viagem começa com um sol radioso em Na Thon, oeste da ilha, que realça ainda mais o azul turquesa do mar que rodeia a ilha. Rumo a sul, contornamos toda a costa de Samui, passamos por pequenas ilhas e rochedos e logo começamos a ver a lindíssima silhueta de Nakhon. Como que um prolongamento das ilhas, Nakon apresenta um misto de montes, escarpas e floresta. No entanto o céu vai-se tornando mais escuro à medida que nos vamos aproximando. Cada vez mais escuro... Cada vez mais escuro...
A chegada a Don Sak é então feita sob uma violenta tempestade. Chuva torrecial e ventos fortes tornam a saída do ferry bastante difícil, principalmente pela cascata de água que jorra com força sobre a passagem... Somos forçados a esperar, mas ao fim de algum tempo, e dado que a chuva não abranda, não temos outro remédio... O autocarro para Surat Thani está à espera.
Chegamos ao autocarro totalmente ensopados, depois de ninguém saber bem qual o autocarro e das dúvidas onde deveríamos deixar as malas. Ao lado um casal chinês na mesma situação.
Uma das minhas designações da Tailândia é "parece que é sempre a primeira vez", mesmo em acontecimentos que são rotineiros, dá sempre a impressão de nunca saberem o que fazer ou o que dizer.
Depois de alguns minutos de viagem o revisor ao confirmar os bilhetes do casal chinês avisa-os que estão no autocarro errado e que para irem para o aeroporto deveriam ter apanhado o outro autocarro. O casal fica em pânico e o revisor preocupado ausenta-se para ver o que poderá ser feito. Ligam então para o motorista do outro autocarro e combinam um ponto de encontro na auto-estrada. Os dois autocarros param, saem os chineses carregados com a bagagem e conseguem entrar no outro autocarro... Esperamos um pouco, e vimos os chineses voltarem de novos com as bagagens... Este era o autocarro certo... Mais uma vez, "Parece que é a primeira vez"...
Ao verificar os nossos bilhetes o revisor pergunta para onde vamos, ao que respondo Kao Lak. _ E como vão? _ Não sei, respondo. Para já Surat Thani e depois vejo se consigo autocarro ou outra forma.
_ A esta hora não há autocarros. _ diz-me, e prontamente retribuo: _ Bom, logo vejo, nem que apanhe um taxi...
_ Eu talvez te consiga ajudar...
Passados uns minutos aparece com uma proposta de um serviço de taxi de Surat Thani para Khao Lak. Eu começo um pouco céptico e digo que prefiro ver quando chegar a Surat Thani. Ele insiste e diz que pode não ser fácil. Depois de alguma discussão negociamos um preço, bastante em conta dada a distância, e aceito. Deixa-nos por uns momentos e volta para reclamar um adiantamento de parte do pagamento para a reserva. Acho tudo um pouco estranho mas confio no senhor e entrego-lhe o dinheiro. Sai e regressa com um pseudo comprovativo/voucher...
Reconheço Surat Thani ao chegar. A zona parece-me familiar e passado alguns instantes consigo identificar alguns edifícios familiares. Estive aqui em 2002 para uma reunião com o cliente... Reconheço os escritórios e o hotel...
Passados uns minutos o autocarro pára numa zona não muito concorrida. O revisor avisa-nos que temos de saír ali e pede-nos para esperarmos uns minutos pelo taxi... Somos os únicos a saír do autocarro ali e dirigem-nos para um pequeno escritório. _ Volto já, responde.
O tempo é aproveitado para o almoço, mesmo passando já das 4 da tarde, com toda a atribulação da viagem ainda não tínhamos comido. Sorte que o escritório também está adaptado a restaurante...
Algum tempo depois chega o revisor com uma aparência bem mais limpa e trajado a rigor dentro de uma viatura praticamente nova. É aí que percebo que o serviço de taxi afinal era ele e que toda aquela insistência era para tentar ser ele a prestar o serviço. Vestiu as suas melhores roupas, pediu ou alugou o carro por umas horas e ali estava ele pronto a ajudar. Pergunta-me se não me importo que leve a sua esposa, para evitar voltar de noite e sozinho. A viagem é longa e prontamente acedo, pois não provoca nenhum inconveniente e para o senhor é bem mais confortável. Mais uma espera pela senhora e partimos, não sem antes enchermos o depósito com o valor do adiantamento.
Depois de 1h30 de viagem e musica country, paramos numa estação de serviço que nos dizem estar localizada sensivelmente a meio do caminho. Visitamos os WC e ao voltarmos a senhora muito gentilmente oferece-nos uns pequenos snacks tradicionais do 7 Eleven que tinha comprado para nós. Ficamos super agradecidos e fãs destes snacks que voltámos a comprar vezes sem conta nos dias que se seguiram...
Algumas horas depois de Surat Thani chegamos finalmente a Khao Lak. A aldeia resume-se a uma avenida larga não muito extensa ladeada de restaurantes, lojas, alguns bares, supermercados e um Mc Donalds. Foi necessário atravessarmos toda a aldeia para encontramos o nosso resort, já no início do parque natural. O nosso "taxi" deixa-nos à porta e agradece-nos de forma muito afável. Agradecemos também a disponibilidade e o prazer que foi a companhia deles durante toda a viagem. Foram de facto muito simpáticos e cuidadosos e percebemos que estavam bastante felizes por poderem prestar aquele serviço. O que para nós foi mais um pequeno passo na nossa viagem, para eles foi uma grande ajuda em termos financeiros. Saí com a muito agradável sensação de ter ajudado aquela família e de ter sido útil, ao invés de ter dado o lucro da viagem a uma qualquer empresa.
Khao Lak / Phang-Nga
Khao Lak fica na província de Phang-Nga e a partir daqui é possível explorar toda esta zona do sul do país e também a sua famosa baía. Começamos pelo parque Marinho de Phang-Nga e uma visita de barco a algumas das suas ilhas.
Phang-Nga distingue-se pelas suas baías azul turquesa, pelas escarpas calcárias sobre o mar cobertas de densa vegetação, pelas aldeias piscatórias e pequenas praias de areia branca.
Um dos locais mais visitados é Ko Phing Kan, também conhecida como Ilha James Bond por aqui ter sido rodado um dos seus filmes. Uma pequena ilha, com várias pequenas praias e cuja principal característica é um rochedo quase que espetado no meio do mar e que deu o tal ar bastante exótico ao filme de James Bond.
No norte do parque fica a pitoresca vila piscatória de Ko Yao, uma vila fundada por uma comunidade muçulmana que aqui se instalou em casas na sua grande maioria flutuantes.
Já na zona costeira fica a Monkey Cave, uma gruta transformada em local de culto que alberga também uma significativa comunidade de macacos. O local é também conhecido por Wat Suhan Kuwa.
No entanto é já no sul do golfo e do Mar de Andaman que se encontra um dos locais mais fascinantes da Tailândia, as ilhas de Ko Phi-Phi Don. Aqui, o azul turquesa toma mesmo conta da paisagem numa transição quase que perfeita com o luminoso azul do céu. Apenas aqui e ali conseguem as falésias calcárias e a vegetação densa da ilha quebrar essa quase perfeita junção.
É aqui que se encontra também Maya Bay, a baía paradisíaca que ficou célebre no filme "A Praia" com Leonardo Di Caprio.
Antes da partida de Khao Lak decidimos ir fazer uma caminhada por um dos trilhos costeiros do Parque Natural que dá acesso a uma fantástica praia deserta na foz de um pequeno ribeiro de águas límpidas que corre do interior do parque. O trilho não apresenta grandes dificuldades a não ser mesmo a vegetação demasiado densa em alguns pontos e a elevada humidade que torna o calor ainda mais unsuportável.
Aqui e ali algumas excelentes vistas soberbas da costa e que vão alternando com a densa e interessante vegetação do parque.
Já na descida para a praia somos alertados por um grupo de jovens, que aparentemente se dirigiam no sentido inverso e estavam parados a cerca de 50m a olhar para o trilho. Chamam-nos e dizem-nos para termos cuidado com algo... Ando mais um pouco e vejo algo tipo um lagarto gigante a ocupar a totalidade do trilho e a olhar para mim com admiração. Vejo que não podemos passar por ele, pois o seu tamanho impõe algum respeito. Percebo também porque o grupo de jovens também estava parado à espera.
Esperamos uns minutos mas o lagarto parece não ter intenção de saír dali... Bom, pego num pau relativamente comprido e tento afastá-lo. No início parece não estar muito disposto mas ao fim de algumas tentativas começa-se a afastar. Vou com cuidado para ver se não se vira contra mim. Tenho sorte e ele acaba por se mandar para o interior da vegetação. Conseguimos passar e o grupo de jovens também. Custou mas conseguimos, e a recompensa é fabulosa.
Phuket
Dado pussuirmos algum tempo antes de apanhar o vôo nocturno de regresso a Bangkok, decidimos passar o dia a visitar Phuket.
Antes de todo este fulgor turístico que se vive em Phuket nos dias que correm, toda a zona era um importante posto de comércio entre a Asia, península Arábica e a India. É por essa razão que em Phuket Town se encontra ainda nos dias de hoje muita arquitectura portuguesa.
A cidade é a grande capital da ilha com o mesmo nome e pelo facto de não ter praia não teve nunca uma grande componente turística. É uma cidade relativamente interessante pela sua arquitectura e pela sua componente cultural em expansão. Ainda assim algo que se conhece em muito pouco tempo.
A cerca de uma dúzia de quilómetros fica a mais badalada estância turística de Phuket, a tão falada Patong. Uma grande baía com uma grande praia e areal que para aqui atraíram uma infinidade de hoteis e toda uma vida derivada do turismo.
Phuket nunca foi uma prioridade e Patong muito menos, mas já que estávamos na zona decidimos conhecer um pouco deste que é um dos grandes centros mundiais de turismo. E não era para menos...
Actualmente Patong é tudo o que o turismo pode trazer de mau, com a agravante de se ter tornado num grande centro de turismo sexual. É o grande destino das crises masculinas de meia idade, do super-ego e dos excessos. Local sem regras e sem limites onde tudo se vive e onde se vive de tudo.
Damnoen Saduak
A cerca de meia centena de quilómetros de Bangkok fica o mercado flutuante de Damnoen Saduak. Outrora um dos grandes pontos de interesse da região, o mercado não passa, nos dias que correm, de uma encenação dedicada ao turista. O mercado de frutas e legumes deu lugar a um mercado de souvenirs e tudo o que possa agradar às centenas de visitantes que por aqui vão passando todos os dias.
Foi talvez a minha maior desilusão em toda a viagem. Ainda assim com algum interesse pois mostra como funcionaram em tempos muitos dos mercados do Sudeste Asiático.
Para terminar a viagem, nada como uns dias sem compromissos em Bangkok para absorver mais um pouco da cidade e visitar alguns dos locais emblemáticos como o Sirocco, um fantástico bar no topo de um dos arranha-céus mais emblemáticos de Bangkok, explorar os restaurantes e os mercados nocturnos de Pat Pong ou deliciarmo-nos com as fantásticas Thai-Massage num dos muitos e agradáveis SPAs da cidade.
Qatar 1 - Doha
"Os olhos são o espelho da alma", Alexander Lowen
Oh sim, que o Médio-Oriente volta a chamar por mim...
Projecto sucessivamente adiado, meses e meses de expectativa e eis que, finalmente se concretiza mas na pior altura do ano. Época do calor, da humidade, do pó e em pleno Ramadão... Uma mescla de condições, todas elas agradáveis, que me acolhem em Doha.
O Qatar é um pequeno país com pouco mais de 800 000 habitantes confinado numa península em pleno Golfo Pérsico. Uma península para não dizer uma língua de areia, pó e pedras que entram mar adentro sobre uma camada de gás e outra de petróleo que tornam este reinado num dos países mais ricos e prósperos do mundo.
Na realidade, esta monótona paisagem alberga muito mais do que o que possamos imaginar à partida. Um misto de tradição, cultura e sofisticação convivem em Doha num ambiente bastante alegre e tranquilo. Na envolvente a magia do deserto e todo o seu potencial.
Doha divide-se em dois mundos, o antigo e interessante, o novo e apático, um de cada lado da grande e lindíssima baía que banha a cidade. A sua marginal é a Corniche, uma das atracções da cidade e dos principais locais de lazer.
No coração da zona antiga da cidade fica Souq Waqif, um grande mercado recentemente convertido que alberga um grande número de lojas, cafés e restaurantes. É o centro social da cidade e ponto de encontro para os locais de todos os estratos sociais.
Local ideal para souvenirs, produtos locais e acima de tudo para o convívio na sua infindável lista de cafés e restaurantes onde a shisha está também sempre presente.
Apesar de renovado, Souq Waqif mantém toda a traça inicial e continua fiel ao mercado que aqui existe há séculos.
Num dos extremos do Souq fica um dos mais emblemáticos edifícios de Doha, o Qatar Islamic Cultural Center, com o seu minarete em espiral e que pode ser apreciado de quase toda a parte antiga da cidade.
Um dos pontos fortes de Doha são mesmo as vistas em torno da baía. De ambos os lados é possível obter imagens bastante impressionantes, sobretudo à noite.
Num moderno e elegante edifício, brindado com um pequeno e subtil toque clássico, fica o Museu de Arte Islâmica. Um lindíssimo museu localizado numa das pontas da baía e de onde se obtêm algumas das melhores vistas da cidade.
Ponto de visita obrigatório tanto para visitantes como para residentes que aqui podem usufruír de um espaço ímpar e muito tranquilo.
Adjacente ao museu está o muito típico porto de Dhow Harbour, albergue de um grande número de barcos tradicionais desta parte do globo. Foi neste pequeno porto que começou uma das minha aventuras fotográficas de uma manhã de sexta, primeiro dia de fim-de-semana no Qatar.
Um dos inconvenientes de visitar o Qatar em Julho é o facto de não se poder saír à rua entre as 7 da manhã e as 5 da tarde. Calor extremo e um sol tórrido tornam qualquer passeio num martírio. Para agravar, durante o ramadão não é permitido comer e beber em público e a falta de água neste ambiente tem os seus riscos.
Ora um dos problemas que encontrei foi o facto de que ao saír após as 5 da tarde já não estava a conseguir captar a beleza da baía de Doha e todo o esplendor das suas águas de um tom de azul que só apetece mergulhar lá dentro. Ao fim do dia o mar torna-se mais escuro e não reflecte aquilo que verdadeiramente é...
Decido arriscar e lá vou eu. Quero muito aquele tom de azul sempre tão delicioso! Saio cedo, táxi até ao porto e lá estou eu entregue a 42ºC de temperatura, ao sol que escalda na pele, e ao vazio, pois ninguém se aventura a andar por aqui a pé nesta hora do dia...
Mas sou mais que recompensado. Ao londo do meu passeio de 5Km consigo registar e deliciar-me com um dos mares mais bonitos que já conheci. Grande inconveniente, é proibido tomar banho! O Qatar ainda não tomou consciência de muito do potencial que aqui tem...
O Qatar tem também muita tradição nas pérolas, o que foi durante muitos anos parte do sustento do país.
Não é a primeira vez que visito um país muçulmano mas é a primeira vez que experiencio o Ramadão. De facto é algo que à partida nos assusta dada a infinidade de limitações que são impostas em especial relacionadas com as nossas tradicionais refeições.
Mas no final, ainda que com alguma dificuldade tudo é gerível. Apesar de praticamente todos os restaurantes estarem fechados, é possível refugirmo-nos e seguirmos com as nossas refeições normais. Claro que comprando em antecipação e estando fora das vistas dos locais.
Depois do pôr-do-sol, tudo volta ao normal! A grande dificuldade foi mesmo a falta de café durante o dia...
Deveras impressionante é também o ritmo de crescimento do país. Vários eventos internacionais como o campeonato do mundo de futebol e a escalada da economia lançada pela exportação massiva de gás e petróleo vão alterando por completo a fisionomia da cidade, cada vez mais alta, cada vez mais imponente...
EAU 2 - Dubai
"Numa grande alma, tudo é grande.", Blaise Pascal
Estávamos no ano de 1998 e decorria a Exposição Mundial de Lisboa a primeira vez que tive consciencialização do que verdadeiramente era o Dubai. Foi nessa mesma exposição que, uma visita ao pavilhão do país me fez ficar pela primeira vez surpreendido com o Médio Oriente.
Um vídeo de vários minutos mostrava o sonho árabe, ainda em fase embrionária mas já surpreendente. O deserto, o espaço, uma cidade a crescer, um mundo de oportunidades. Desde então acompanhei mais de perto o que por lá se passava e foi-se tornando real a vontade de conhecer o país. É certo que essa vontade foi decrescendo recentemente sob a ameaça da "artificialidade" mas ainda assim a curiosidade estava lá. Aproveita a estadia em Abu Dhabi, e num sábado lá vou eu...
A viagem faz-se num autocarro confortável, com AC e serviço de bordo. Café, snacks? _ pergunta. São cerca de 150Km numa larga auto-estrada pelo deserto e onde o separador é todo ele ajardinado do princípio ao fim. Um eficiente sistema de rega não deixa que o verde sucumba ao amarelo do deserto e torna assim toda a viagem bem menos monótona em termos visuais.
Uma hora e meia depois entramos na grande urbe. O primeiro contacto é deveras impressionante com as altíssimas torres do Dubai Marina a obrigarem-nos a torcer o pescoço de tanto olhar para cima. Bolas que isto é mesmo à grande! Com este primeiro aglomerado de torres a auto-estrada sofre também um aumento. De 3, 4 faixas passa para 6, 7 em cada sentido. Surge também o metro de superfície que nos vai acompanhar até ao centro da cidade... Mas ainda falta, pois uma placa indica que faltam mais de 30Km...
Chegamos por fim à estação rodoviária do Dubai onde se vive normalmente uma azáfama considerável entre vendedores, viajantes e emigrantes.
Ao longo de toda a viagem fui pensando no que realmente gostaria de visitar na cidade. Pensei no pontos turísticos e na oferta existente e foi a primeira vez que senti que nada me despertava grande interesse. Curiosidade, alguma vontade de visitar, mas nada de muito intenso ou de grande apelo. Bom, dedico-me aos pontos principais e depois um passeio para sentir verdadeiramente a cidade. Para começar, o Burj Khalifa, o novo grande ícone do Dubai.
O Burj Khalifa é actualmente a torre mais alta do mundo com mais de 800m e alberga um hotel, escritórios, um miradouro e ainda se orgulha de possuir os elevadores mais rápidos do mundo... A base pega com o Dubai Mall, o maior centro comercial do Dubai.
A vista do miradouro é absolutamente fantástica e vale a subida. Daqui é possível ver toda a cidade e é impressionante sentir que todos os outros arranha-céus da cidade estão todos lá em baixo, pequeninos...
Ao longe, o Burj Al Arab e um dos projectos mais megalómanos entretanto abandonado e que previa a construção de ilhas que formariam o mapa mundo.
Dentro do Dubai Mall é possível encontrar um grande oceanário que, como seria de prever, possui a maior parede em vidro de aquário do mundo. Isto, dentro do centro e aberto a todos os visitantes.
Próxima paragem, Burj Al Arab.
Outro dos símbolos do Dubai é o famosíssimo Burj Al Arab, o luxuoso hotel de 6 estrelas junto a Jumeirah Beach. O edifício é bastante bonito e elegante e está paredes meias com uma das praias mais apreciadas da cidade. O tempo convida, mas o pouco tempo não deixa!
Breve passagem pelo Business District e novo rumo, os famosos Souks.
O Dubai é também conhecido pelos seus importantes mercados, os Souks, pois desde sempre este foi um ponto estratégico de trocas comerciais. O mais importante é o Gold Souk, grande mercado do ouro onde segundo os especialistas é possível comprar ouro a preços muito atractivos. Mas existem outros de referência, como o Souk das especiarias ou o Souk dos perfumes.
A juntar à zona portuária esta é de facto a minha zona favorita, pois consegue ainda manter alguma tradição num ambiente bastante mais típico. Aqui o mais fascinante é deixarmo-nos perder pelas estreitas e sinuosas ruas dos Souks e absorver toda aquela mescla de cheiros, cores e sensações. Este é o verdadeiro mundo árabe.
Fora do frenesim dos Souks vive-se o frenesim do porto num constante carrega e descarrega de todo o tipo de bens. Aqui tudo chega e daqui tudo parte na busca constante do destino.
Foi também aqui que vi uma das paragens de autocarro mais interessantes dos Emirados, toda ela fechada e com ar condicionado para refrescar quem espera. Faz sentido neste país de calor tórrido.
Para terminar a jornada, o regresso ao mundo novo e o grande espectáculo de luz, som e água do Dubai Mall.
Foi interessante a visita ao Dubai mas no geral é uma cidade que não supera espectativas. Continuo a apreciar o estilo mais "cosy" de Abu Dhabi onde tudo está mais perto e acessível do que o estilo megalómano do Dubai onde o elevado espaçamento e distância entre pontos torna a mobilidade mais difícil. Mesmo com o metro a tarefa não foi facilitada pois o facto de tudo estar disperso leva a que além de ser preciso andar sempre um grande número de estações, depois existe ainda uma grande distância a percorrer entre a estação e o ponto destino. Do Burj Khalifa ao centro são cerca de 20Km, do Burj Al Arab mais de 30Km.
É no entanto uma cidade muito mais ocidental e de muito maior oferta. Uma cidade que oferece condições e que realiza sonhos. Cidade de expatriados e de empreendedores.